Igreja Mórmon Discrimina Famílias LGBT

A Igreja Mórmon oficializou a discriminação institucional contra famílias LGBT essa semana.

Crianças num lar estável com pais dedicados e amorosos: Dependendo da família, a Igreja Mórmon não as quer.

Crianças num lar estável com pais dedicados e amorosos: Dependendo da família, a Igreja Mórmon não as quer, e ainda propõe-se a destruir esses lares.

Com duas mudanças administrativas, uma anunciada publicamente e outra efetivada em relativo sigilo, A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, nome oficial da Igreja,  apresenta uma nova política oficial de discriminação contra um grupo minoritário.

Essa não é a primeira vez na história Mórmon que famílias de minorias sofreram discriminação pela Igreja SUD. Até 1978, a Igreja terminantemente proibia casamentos interraciais e casamentos entre negros, ou selamento de crianças negras, em seus templos sagrados.

Agora as famílias sofrendo discriminação na Igreja são as compostas por casais LGBT.

Ontem, a Igreja anunciou que crianças em lares LGBT não poderão ser abençoadas ou batizadas. Essa proibição vale para crianças adotivas ou mesmo biológicas, e vale para casais que coabitem ou mesmo que sejam legalmente casados.

Ademais, a Igreja SUD exigirá, para que tais crianças possam ser eventualmente batizadas, que elas tenham 18 anos de idade, renunciem e repudiem suas famílias e abandonem seus lares.

Uma criança natural ou adotiva de um dos pais que vive em uma relação do mesmo-gênero, seja o casal casado ou em coabitação, não pode receber um nome e uma bênção.

Uma criança natural ou adotiva de um pai que vive em um relacionamento do mesmo-gênero, seja o casal casado ou em coabitação, pode ser batizada e confirmada, ordenada, ou recomendada para o serviço missionário somente se: Um presidente de missão ou um presidente de estaca solicitar aprovação do Gabinete da Primeira Presidência para batizar e confirmar, ordenar, ou recomendar o serviço missionário para uma criança de um pai que viveu ou está vivendo em uma relação do mesmo-gênero quando ele estiver satisfeito por entrevistas pessoais que ambos os seguintes requisitos são atendidos:

1. A criança aceita e está empenhada em viver os ensinamentos e doutrinas da Igreja, e especificamente repudie a prática de coabitação ou casamento do mesmo-gênero.

2. A criança é maior de idade e não vive com um pai que viveu ou vive atualmente em uma relação de coabitação ou casamento do mesmo-gênero.

A outra mudança de política, anunciada apenas para a liderança masculina da Igreja, foi a inclusão no Manual de Instruções da Igreja (antigo Manual Geral de Instruções), um guia oficial secreto sagrado para a liderança do Sacerdócio, de uma nova definição do termo apostasia. De acordo com a nova definição, contrair ou estar em um casamento homoafetivo legal constitui apostasia e, portanto, ambos(as) parceiros(as) estão passíveis de excomunhão.

O novo texto do manual diz (ênfase nossa):

Como usado aqui, apostasia se refere a membros que:

  1. Repetidamente agem em oposição pública clara, aberta, e deliberada à Igreja ou a seus líderes.
  2. Persiste em ensinar como doutrina da Igreja informação que não é doutrina da Igreja após haverem sido corrigidos por seus Bispos ou autoridade superior.
  3. Continuam a seguir os ensinamentos de seitas apóstatas (como as que advogam casamento plural) após haverem sido corrigidos por seus Bispos ou autoridade superior.
  4. Estão em um casamento do mesmo gênero.
  5. Formalmente aderem a outra igreja e advogam os seus ensinamentos.

Os líderes do Sacerdócio devem tomar ações disciplinares contra apóstatas para proteger os membros da Igreja.

A Igreja SUD, cuja ambição pública é o branding e o marketing como “defensora da família”, oficialmente optou por perseguir, discriminar, e destruir, institucionalmente, as famílias que não se encaixam em seus moldes heteronormativos.

Ausente em todas as pregações e ensinamentos dos Apóstolos e Profetas Mórmons é a explicação de como perseguir famílias LGBT, com pais/mães dedicados(as) às suas crianças, tornam famílias “tradicionais” melhores, mais unidas, ou mais felizes.

Cruzada Mórmon Anti-Gay

Um colunista do site de notícias The Huffington Post delinea em excelente artigo um resumo da evolução histórica do envolvimento d’A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias com a cruzada anti-gay no movimento da chamada “direita religiosa” nos EUA.

O ímpeto para lançar-se nessa cruzada que já dura décadas veio dos sucessos das campanhas furtivas da Igreja Mórmon para derrotar a Emenda Constitucional dos Direitos Iguais, que garantiria proteção para mulheres contra discriminação por gênero.

Havendo participado de maneira decisiva desse sucesso coletivo em conjunto com outras forças conservadoras norte-americanas (e.g., as igrejas Católica, Adventista, Batista, e as coalisões em tôrno do Partido Republicano) e ganhado uma medida de prestígio nesses meios, a Igreja SUD começou a se preparar legal, jurídica, e financeiramente para campanhas similares, desta vez contra outro grupo minoritário.

Ativistas a favor de direitos civis para LGBT começavam lentamente a fazer-se ouvir e a promover leis que os protegessem contra discriminação. O primeiro estado onde tais leis, incluindo a legalização de matrimônio, protegendo homossexuais estava sendo sériamente consideradas era o Havaí.

A Igreja Mórmon preparou-se adequadamente e, logo antes de formalmente iniciar a cruzada para a qual já se preparava há mais de uma década, publicou um novo documento oficial que serviria de embasamento religioso e filosófico, além de estandarte de guerra.

Proclamação da Família

Escreve, sobre esse documento, Fred Karger:

A Igreja Mórmon recentemente “celebrou” o  20° aniversário de seu odioso “A Família: Uma Proclamação Ao Mundo.” A proclamação foi lida pelo então Presidente da Igreja Gordon B. Hinckey na Conferência Geral da Sociedade de Socorro em 23 de setembro de 1995, na Cidade de Lago Salgado, Utah. A ocasião marcou o dia em que a Igreja Mórmon declarou guerra contra o casamento gay. A Igreja ordenou que seus membros enquadrassem suas cópias da Proclamação para pendurá-las em seus lares. A maioria das famílias Mórmons fizeram isso.

Não coincidentemente, também em 1995, a Igreja Mórmon iniciou sua luta [política] contra o casamento gay no Havaí. [Os líderes da Igreja] traçaram planos elaborados para bloqueá-lo no primeiro estado onde estava sendo considerado. Quando a liberdade para [bloquear] casamento [gay pelo estado] finalmente chegou a voto no Havaí após três anos, ela foi aprovada. Após essa vitória em 1998, a Igreja Mórmon deu seguimento à sua campanha furtiva para proibir casamento gay por todos os Estados Unidos.

Campanhas Políticas

A Igreja Mórmon contribuiu diretamente com USD 400 mil no Havaí, e ainda angariou muito mais de seus membros e aliados, contratou um exército de advogados, consultores políticos, e lobistas em 30 estados, e criou grupos fantoches para esconder seu envolvimento nessas campanhas. Ela gastou diretamente milhões de dólares e mobilizou milhares de membros pelos próximos 13 anos até a campanha da Proposição 8 em 2008.

A Igreja Mórmon foi pega de surpresa ao ter sua participação central em todas aquelas campanhas estaduais por quase duas décadas denunciada em público em 2008, num desastre de relações públicas que a forçou a gastar dezenas de milhões de dólares em campanhas publicitárias para desfazer o branding negativo.

Proposição 8

Em 20 de junho de 2008, apenas três dias após o casamento gay haver sido legalizado pela Suprema Corte da Califórnia, o novo Presidente da Igreja Thomas Monson anunciou através de carta lida em todas as unidades no estado que todos os membros deveriam “doar seu tempo e seus meios” para a campanha para passar a Proposição 8 [que ilegalizaria o casamento gay]. Na carta, o Presidente Monson ameaça os membros que “suas almas estariam em perigo” se não doassem dinheiro [para a campanha]”.

A Igreja Mórmon coagiu membros a doarem mais de USD 30 milhões durante os 4 meses de campanha, 77% de todo o dinheiro arrecadado para essa votação, constituindo a principal força responsável pela vitória da Proposição 8, que passou com a pequeníssima margem de 52-48.

A Igreja Mórmon não apenas financiou, mas também controlou, a administração da campanha política ‘Yes on 8’, montando uma verdadeira campanha de guerra em Utah e Idaho para telemarketing de eleitores na Califórnia.  Ela transportou milhares de membros da Igreja para fazer campanha política, enviou material impresso para milhões de eleitores, organizou 25 000 voluntários membros da Igreja para bater portas durante 9 fins-de-semana por todo estado, financiou e administrou treinamentos para seus representantes, distribuiu centenas de milhares da placas de publicidade, além de panfletos, mobilizou 100 000 membros como voluntários para trabalhar no dia da eleição, construiu e manteve vários sites na internet para o ‘Yes on 8’, criou 4 eventos televisivos e 9 comerciais, e conduziu 2 transmissões ao vivo para 5 estados em preparação à mobilização de voluntários.

A Igreja Mórmon Mente Sobre A Proposição 8

A Igreja Mórmon registrou gastos de apenas USD 2 078 por toda sua operação de guerra como contribuições para o ‘Yes on 8’. A Comissão de Práticas Políticas Honestas da Califórnia (California Fair Political Practices Commission ou FPPC) investigou a Igreja SUD por 18 meses, condenando-a em 13 casos de fraude eleitoral. A Igreja Mórmon confessou-se culpada e pagou uma multa não publicada.

Documentos Mórmons Secretos

Em fevereiro de 2009 um informante vazou documentos secretos da Igreja Mórmon, delineando toda campanha política contra casamento gay pelos últimos 13 anos, que o repórter publicou no site Mormongate.com.

A Igreja Mórmon recusou-se a confirmar ou a negar a autenticidade desses documentos.

Outros documentos adicionais foram publicados no Mother Jones e no Frontiers Magazine.

Os documentos provam que a declaração de guerra da Igreja Mórmon contra o casamento gay e a comunidade LGBT em 1995 foi deliberada e planejada por mais de uma década, e que a entrou em coluio com a Igreja Católica para a cruzada anti-gay.

Ademais, a Igreja Mórmon foi a extremos para ocultar sua participação nessa cruzada política, inclusive criando o último grupo fantoche Organização Nacional pelo Casamento (National Organization for Marriage ou NOM) em 2007 para conseguir qualificar-se para elaborar e passar a Proposição 8.

Reflexo Entre Membros

A Igreja Mórmon causou enorme fissão entre membros por causa de seu apoio à campanha da Proposição 8 na Califórnia para suspender a legalização do casamento homossexual no estado. (Ver “Mormon Power Grab: It’s Tearing Families Apart”).

O consultor de marketing da Igreja Gary Lawrence confessou ao Washington Post que os danos na imagem pública por causa da Proposição 8 foram muito maiores que teriam antecipado.

Informantes dentro da Igreja indicam que ela perdeu até 1 milhão de membros ativos e fiéis nos últimos 7 anos por causa da cruzada anti-gay. Esses membros, ativos e voluntários dentro da Igreja (em chamados) optaram sair da Igreja em demonstração de apoio a seus familiares e amigos dentro da comunidade LGBT.

Coincidentemente, esta semana o prestigioso centro de pesquisas demográficas Pew Research Center publicou estudo demonstrando que Mórmons estão mudando de opinião e cada vez mais aceitando a homossexualidade como uma expressão normal da sexualidade humana, crescendo 50% a aceitação entre membros da Igreja quando comparado com o mesmo estudo de 2007, antes do fiasco da Proposição 8.

Após mais de uma década de preparações e investimentos, e após uma década de vitórias políticas e jurídicas, a Igreja SUD encontrou-se na defensiva após 2008, tanto com o público em geral, quanto com os seus próprios membros. A Igreja abrandou sua postura e até passou a apoiar algumas leis anti-discriminatórias. Não obstante, continuou lutando contra alguns direitos civis básicos, bandeando com outras igrejas e grupos conservadores, inclusive incentivando e apoiando notórios grupos de ódio pregando discriminação contra pessoas e famílias LGBT. Como consequência, a Igreja vem perdendo membros e parece estar até perdendo a “pureza” ideológica deles.

Seria esse endurecimento ou entrincheiramento recente um reflexo da preocupação dos líderes da Igreja Mórmon com o controle da situação entre seus próprios membros?

[ATUALIZAÇÃO: Imediatamente após o vazamento dessa mudança oficial, líderes da Igreja SUD saíram à caça da fonte do vazamento e em defesa da nova política, tentando inclusive suaviza-la para mitigar seus efeitos negativos de relações públicas. Milhares de membros da Igreja saíram às mídias sociais e às ruas para protestar a nova postura da Igreja, e milhares abandonaram a Igreja pedindo resignação, entre eles até famosos apologistas SUD, apologistas SUD menos famosos, e famílias de jovens afetados pela mudança. Subsequentemente, a taxa de suicídio entre jovens SUD aumentou drasticamente no ano seguinte à mudança, levando a grupos de mães mórmons dedicadas a proteger seus filhos da Igreja e as consequências de suas políticas de discriminação antigay.] 


Leia mais sobre a Proposição 8.

Leia mais sobre associação de Igreja com essas organizações.

Leia mais sobre reações da Igreja com controversias legais.

91 comentários sobre “Igreja Mórmon Discrimina Famílias LGBT

  1. A Igreja nunca vai aceitar uma família LGBT por que vai contra os princípios e doutrinas da Igreja.
    Como é ensinado pelos profetas antigos, modernos e etc. Deus criou Adão e Eva e não Adão e Estevão, ou Eva e Estela.

    Precisamos ter isto em mente e a Igreja sempre irá contra isso.
    Agora, o fato de discriminar por dizer que é errado, é um ponto de vista da ABEM e não da Igreja. A Igreja não discrimina ninguém, acho interessante o fato de citarem os negros e não simplesmente explicarem o por que eles não entravam nos Templos.

    A interpretação esta totalmente errada.

    • Não sei se você leu a mesma notícia que eu, mas quem vai sofrer discriminação são as crianças filhas de homossexuais. A Igreja está punindo as crianças, ou adolescentes, pelos atos dos pais homossexuais.

      A segunda medida, que é aceitar sob batismo apenas de quem for maior de idade e negar seus pais, é ainda mais perversa. Eles estão exigindo que a pessoa rejeite quem lhe deu educação, alimentação, subsistência, quem foi sua família, para que essa pessoa possa ser aceita na instituição. O sujeito pode se interessar pela igreja, mas jamais vai perder os laços afetivos por quem lhe deu um lar.

      Imagine a seguinte situação: um sujeito hétero, que atende aos demais requisitos, quer se batizar na igreja. Então, os missionários perguntam sobre a família dele. O candidato ao batismo diz que seus pais são separados, que sua mãe continua solteira e seu pai acabou se casando legalmente com outro homem. Durante um tempo, ele foi criado pelo pai e tem uma relação tranquila com o pai, tanto quanto com a mãe. Então, os missionários dizem: você só pode ser batizado se cortar relações com seu pai.

      Isso é bizarro! Não por condenar o ato da homossexualidade. Mas por exigir que as pessoas cortem relações com familiares para que possam ser aceitas na igreja sendo que elas não podem ser responsabilizadas pelos atos de outrem. Como você pode dizer que a Igreja não vai discriminar ninguém?

      • Não adianta, tem gente que não entende o que lê e nem os fatos. Mas eu iria comentar algo parecido, então obrigado por me poupar a digitação.

      • E vc acredita? Vai visitar a igreja pra vê se filhos de legbts não entram e se batizam, o engraçado é que as pessoas nem entrar na igreja entraram e sai dizendo coisa que nem sabe

    • Você é retardado ou se faz? Se você leu a matéria viu que não se tratava de que casal o Senhor colocou na terra mas sim do simples fato de a igreja negar o batismo aos filhos de homossexuais, seja esse filho adotado ou não, o que é totalmente errado… Afinal, ninguém pode pagar pelos pecados de outras pessoas, Cristo já fez isso. E como muitos dizem “a salvação é individual”. Se voce quer uma dica para não passar vergonha novamente, leia a matéria e só depois comente.

      • A Igreja nunca vai discriminar alguém de frequentar a Igreja. A pessoa só não pode assumir compromissos sem estar cumprindo o que Deus pede.
        Em relação ao batismo da criança. Ela pode sim se batizar. Más a idade foi alterada para 18 anos para ter então certeza que aquele adolescente está buscando a Deus e tendo com consciência do erro dos pais. Aliás como você mesmo disse:”uma criança não pode ser culpada do erro dos Pais” 😉

      • Quer dizer então que uma criança pode se batizar desde que tenha 18 anos de idade? Na sua cabeça, pessoas com 18 anos de idade são crianças?

        Você leu em algum lugar do texto a afirmação de que alguém seria “discriminado” de “frequentar a Igreja”?

        Você entende que estabelecer regras diferentes para pessoas diferentes baseadas em características pessoais idiossincráticas e fora do arbítrio individual é a própria definição de discriminação?

        Você acha que Deus pediu para a Igreja discriminar contra negros? Se Ele pediu, então porque vários Apóstolos afirmaram depois que não sabiam se Deus havia pedido ou não?

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