Abraão Faz 45 Anos

HipocéfaloNesta semana (dia 27) comemoramos o aniversário de 45 anos de quando o Museu Metropolitano de Arte de Nova Iorque devolveu para A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias os papiros originais usados por Joseph Smith, jr., para produzir o Livro de Abraão.

Esse evento foi comemorado com grande antecipação e efusivos sentimentos de antecipação, esperança, e até uma sensação de validação. Por mais de um século, estes antigos documentos haviam sido dados como perdidos, e subitamente em 1967 não apenas haviam sido re-encontrados, mas haviam sido retornados à Igreja!

Contudo, tão logo passou a euforia e o regozijo inicial, recaiu sobre a Igreja o que apenas pode ser descrito como “desconforto” sobre o documento, levando a quase silêncio da instituição oficial, e a décadas de esforços intensos (e inúteis) de dúzias de apologistas.

Como houve bastante interesse em comentários passados, em outros posts, sobre discutir a importância desse achado arqueológico, eu acho que essa data importante é a perfeita oportunidade (desculpa) para abrirmos espaço para essa discussão. Segue abaixo apenas uma breve introdução ao tema.

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10 Clichês Mórmons Devem Evitar

Quem não tem um parente próximo, querido, amado, que nos mata de vergonha quando em companhia de nossos amigos ou colegas? Pode ser um tio racista, ou um irmão cara-de-pau; pode ser um pai preconceituoso, ou uma mãe que gosta de opinar da vida alheia sem filtros sociais. Nós amamos e adoramos tais parentes, mas acabamos morrendo de vergonha de apresentá-los a nossos amigos e colegas.

O mesmo pode ocorrer na Igreja. Quem, dentre os ex-missionários, nunca quis morrer (ou matar alguém) ao levar aquele investigador especial à sua primeira reunião dominical, apenas para ouvir um irmão ou uma irmã subir ao púlpito para prestar aquele testemunho mais cabeludo, de dar arrepios no missionário mais calejado?

Em absolutamente todas circurnstâncias sociais, há sempre a possibilidade de se cometar uma gafe ou causar um certo desconforto com a palavra errada, ou a ideia mal colocada. Todos nós passamos por isso, seja cometendo a gafe, seja testemunhando o desastre social inevitável.

Contudo, há gafes sociais que são recorrentes dentro de determinadas culturas ou contextos sociais. Um exemplo clássico é daquela pessoa sem noção que se aproxima de uma moça mais gordinha e lhe pergunta o tempo da gestação!

“As pessoas exigem liberdade de expressão para compensar pela liberdade de pensamento que elas raramente usam.” ― Søren Kierkegaard

(Nota: aos desavisados, nunca, nunca, nunca pergunte tempo de gestação ao menos que você tenha absoluta certeza se a moça esta grávida. Em caso de dúvidas, pergunte-lhe as novidades em sua vida, e permita-lhe a oportunidade de anunciar — ou não — sua gravidez. Eu já testemunhei essa gafe algumas vezes, e posso dizer que a dor no peito é real!)

Eu compilei, então, as gafes — ou clichês — mais comuns entre mórmons no Brasil, ao menos na minha experiência pessoal. Montei uma lista das 10 gafes que eu mais encontrei na vida, e as que mais me causaram desconforto cultural, social, e intelectual. Quando proferidas na frente de um convidado não-mórmon, me causaram vergonha, e quando proferidas na frente de apenas mórmons velhos de causa, me causaram apenas constrangimento.

Compartilho a minha lista para incentivar os demais mórmons a evitá-las como quem evita a gripe suína, e também na esperança de que compartilhem comigo as gafes que mais lhes incomodam, e o por quê.

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O Profeta Índio. Ou Joseph Smith?

A evolução da doutrina mórmon ao longo da história deixou muitas marcas nas obras publicadas pela Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, incluindo o próprio Livro de Mórmon. O exemplo a seguir mostra como uma profecia específica em 2 Néfi 3:24 teve sua interpretação reformulada em décadas recentes.

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Esquecendo os lamanitas? Imagem: John Rocha.

Numa porção do Livro de Mórmon que santos dos últimos dias acreditam se referir à restauração do evangelho original, há a menção a um personagem futuro:

E levantar-se-á entre eles um poderoso que praticará o bem, tanto em palavras como em obras, sendo um instrumento nas mãos de Deus, com fé extraordinária para operar grandes maravilhas e fazer o que é grandioso aos olhos de Deus, a fim de levar muita restauração à casa de Israel e à semente de teus irmãos.

Alguns mórmons dos séc. XIX e XX identificavam esse personagem como um futuro “profeta índio” ou “profeta lamanita”. Na edição em espanhol do Livro de Mórmon lançada pela missão mexicana em 1920, por exemplo, as notas de rodapé elaboradas por Rey Lucero Pratt, então presidente da missão, faziam questão de esclarecer aos modernos descendentes dos lamanitas que o hombre poderoso referido no versículo acima era un profeta Lamanita.

Livro de Mórmon da missão mexicana, 1920.

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El, Jeová e Elohim

Uma informação e uma provocação

Na Bíblia hebraica, o nome Elohim ocorre 2570 vezes, enquanto YHWH (“Jeová”) aparece em 6823 vezes. Já o termo El aparece apenas 238 vezes. No entanto, o uso desses termos é muita vezes combinado, sugerindo a identidade única de Jeová e Elohim. Isso evidentemente passa despercebido a leitores de traduções para o português ou outras línguas ocidentais, uma vez que essas traduções acabam por uniformizar os nomes e esconder o uso dos nomes originais.

Tetragrammaton (YHWH) escrito em alfabeto paleo-hebraico no pergaminho 8HevXII, datado do primeiro século EC

Observemos esta passagem de Deuteronômio, de acordo com a tradução de Ferreira de Almeida: Continuar lendo

Falar com seu Deus

Duas citações de Joseph Smith sobre a revelação direta.

Ler a experiência dos outros ou as revelações dadas a eles, nunca pode nos dar uma visão ampla de nossa condição e verdadeira relação com Deus. Continuar lendo

Êxodos: um lamento

Walk away, de Lietinga Diena, site Deviant Art.

Walk away, de Lietinga Diena, site Deviant Art.

O êxodo é um tema constante nas escrituras judaico-cristãs e sud. Esse êxodo consiste na busca de uma “terra prometida” ou “terra de promissão”, deixando para trás uma sociedade corrompida que promove o mal e oprime os justos. Trata-se não apenas de uma fuga ou migração mas, sobretudo, de um processo de transformação daqueles que entram na jornada. Continuar lendo

Desafio de história mórmon: Joseph e a Bíblia

Você, leitor(a), está convidado(a) a testar seus conhecimentos de história mórmon.

Um dos pressupostos doutrinários da restauração é a antiga corrupção das escrituras bíblicas, certo? Joseph Smith afirmou que elas não haviam chegado aos leitores modernos em sua forma original. Ele também criticava as traduções modernas e afirmou que, dentre as traduções que havia conhecido, uma seria a melhor. Nossa pergunta é: que tradução Joseph Smith considerava a mais correta?

Pergunta bônus: o que ele queria dizer com “mais correta”?

Veja aqui o desafio anterior.

Aprenda mais sobre a história mórmon no Brasil.

Jeová, o Pai

No meu post anterior, mostrei como, de acordo com algumas escrituras bíblicas, Cristo não pode ser considerado o Deus que interagiu com os antigos israelitas. O “Deus de Abraão, Isaque e Jacó” para os autores do Novo Testamento é o próprio Pai e não seu Filho. Nesta continuação do tema, busco novamente na relação do Novo Testamento com a bíblia hebraica a identidade de Jeová como o Pai; também utilizo uma importante escritura de Doutrina e Convênios para mostrar como Joseph Smith também usava o termo Jeová para se referir ao Pai. Continuar lendo

A Errônea Associação do Catolicismo à Corrupção das Escrituras

Um dos fundamentos doutrinários dos santos dos últimos dias é a afirmação de que as escrituras bíblicas não permaneceram intactas desde a pena de profetas e apóstolos até nossos dias, mas sofreram adulterações de forma que passagens foram retiradas, editadas ou acrescentadas.

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Estudo do Retrato do Papa Inocêncio X por Velázquez, de Francis Bacon (1953)

Em 1 Néfi 13, lemos sobre a visão recebida por Néfi da instituição responsável pela corrupção do Novo Testamento, chamada de “grande e abominável igreja”. Muitos santos dos últimos dias interpretam essa instituição como sendo a Igreja Católica Apostólica Romana, embora a ação da “grande e abominável igreja” sobre as escrituras, descrita no Livro de Mórmon, não possa ter nenhuma relação histórica com o catolicismo romano. Continuar lendo

Labão e os muitos “Labões”

O obscuro Labão está muito mais presente nas escrituras do que podemos imaginar. Também sua importância no relato nefita pode ser maior do que nos é transmitido pela leitura correlacionada das escrituras. Labão encarna características descritas em maior detalhe por outros profetas do passado, sobre as quais somos alertados. Continuar lendo

Mórmons veem uma relação histórica entre o catolicismo romano e a corrupção das escrituras?

Esta é uma pesquisa sobre a percepção dos santos dos últimos dias sobre a Igreja Católica e o suposto vínculo dessa instituição com a corrupção das escrituras bíblicas.

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O Livro Tibetano dos Mortos e o Livro de Mórmon

Que paralelo poderia ser traçado entre O Livro de Mórmon e o Livro Tibetano dos Mortos? Pelo nosso bom senso, nenhum, certo? Mas não é isso o que diz Donald S. Lopez Jr., um especialista em budismo e estudos tibetanos da Universidade de Michigan. Continuar lendo

O livro mais subestimado

John HajicekConhecemos a famosa equação que nos diz haver uma relação perfeita entre a origem histórica do Livro de Mórmon, o chamado de Joseph Smith como profeta e a Igreja sud como a única igreja que possui autoridade divina. Como não-membro, isso me foi ensinado nas palestras missionárias, e como missionário, também reproduzi isso a outras pessoas. Hoje percebo, no entanto, que pode haver um efeito nocivo, colateral, nessa equação. Continuar lendo

Missionários Robôs?

(…) se tendes OU NÃO o desejo de servir a Deus, sois chamados ao trabalho.

Muitos detectarão no verso acima uma edição sacana da escritura em Doutrina e Convênios 4:3. Quem quer que o compare com o original, perceberá uma mudança total de significado, onde a condição individual de querer ou desejar servir simplesmente perde seu sentido. No entanto, foi basicamente isso que ouvi em um discurso na sacramental, na semana passada.robotsAo falar sobre a importância de compartilhar o evangelho através da missão de tempo integral, o discursante disse “É por isso que aqueles que têm o desejo…”, quando então pausou e se corrigiu: “Não! Para os rapazes que têm ou não o desejo e para as moças que tiverem o desejo…”.

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Escrituras como “armas”

Muitas vezes escutei na Igreja a metáfora das escrituras como armas. Nunca simpatizei muito com a ideia, mas tampouco havia sentido tão fortemente seu aspecto negativo até ouví-la umas quatro vezes seguidas na mesma aula da Escola Dominical.

Apesar de narrativas sangrentas ou metáforas que evocam imagens bélicas, as escrituras em si não apresentam tal metáfora de serem armas. Armas são feitas para ferir alguém ou destruir algo ou, no mínimo, ameaçar que alguém será ferido ou algo será destruído, ainda que em defesa própria. Fica difícil pensar nas escrituras como tendo semelhante propósito. Continuar lendo