Artigo originalmente publicado aqui, e reproduzido com permissão da Religion Dispatches. Assine ao seu boletim de notícias gratuito, ou siga o RD no Facebook ou no Twitter para atualizações diárias.
Enquanto a liderança SUD rescindia sua proibição de batizar crianças de pais LGBT, eles estranhamente afirmavam que nem a igreja nem a vontade de Deus mudaram. Você quase consegue ouvi-los dizer: “Olha, não nos culpe pelo fato de que Deus acha sua homossexualidade repugnante! Somos apenas os mensageiros!
Membros da Primeira Presidência durante a 189 Conferência Geral Anual, no Centro de Conferências de Salt Lake City, 6 de abril de 2019 (© 2019 INTELLECTUAL RESERVE, INC.).
A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias me ensinou o conceito de mordomia, de ser incumbido de nutrir, proteger e garantir o bem-estar de algo que você não possui. Mordomia significa que você é responsável tanto por aqueles que lhe confiaram quanto pelos seres ou coisas que você supervisiona. Na crença SUD, os pais têm a mordomia das crianças, os bispos têm as mordomias sobre as alas, e Adão e Eva tinham a mordomia do Jardim do Éden. Os apóstolos SUD têm uma mordomia da igreja e de seus membros – e sobre o planeta e sobre todos os povos, já que os apóstolos se consideram porta-vozes autorizados de Deus na terra.
Eu estive pensando sobre isso em relação a POX, ou Política de Exclusão, de novembro de 2015 da Igreja SUD. Essa política classificava as relações entre pessoas do mesmo sexo como o pecado da apostasia e negava ser abençoado quando bebê e batizado aos oito anos de idade a qualquer “filho natural ou adotivo de um pai vivendo em um relacionamento de mesmo gênero, seja o casal casado ou amasiado.”
A liderança insistiu que a POX era uma ideia de Deus, mas isso nunca fez sentido, exceto como retaliação mesquinha sobre a derrota da Igreja em sua batalha de décadas contra o casamento gay. Embora a escritura SUD afirme que “os pecados dos pais não podem ser visitados sobre as cabeças dos filhos” (Moisés 6:54), a igreja parecia ansiosa para ser o instrumento contundente pelo qual o que considerava “a iniqüidade dos pais” ( Deuteronômio 5: 9) seria visitado sobre seus filhos.
Os comícios foram organizados assim que a política foi anunciada. Centenas, senão milhares, de santos dos últimos dias renunciaram a suas filiações como membros em protesto. Aumentos em taxas de depressão e suicídio foram atribuídos a ela. A igreja parecia insensível e cruel.
Na quinta-feira, durante a sessão de liderança da Conferência Geral, a igreja rescindiu abruptamente a política. Um pronunciamento bizarro enfatizou que “as mudanças não representam uma mudança na doutrina da Igreja” porque “não podemos mudar a doutrina do Senhor”, mas a igreja quer que “nossos membros e nossas políticas considerem aqueles que lutam contra os desafios da mortalidade”. (Perguntas: Precisamente quem não está lutando com os desafios da mortalidade? A consideração pelas lutas da mortalidade não está subjacente aos ideais mais célebres do cristianismo?)
A declaração é semelhante a um agente de atendimento ao cliente que repete o fato de que seu empregador não lhes dá o poder de resolver o problema que um cliente está relatando. Você pode ouvir Dallin H. Oaks e Russell M. Nelson, da Primeira Presidência, dizendo: “Olhe, não nos culpe pelo fato de Deus achar abominável sua homossexualidade! Somos apenas mensageiros!”
Não há reconhecimento de mordomia, nenhuma admissão de agência e autoridade (e seu possível uso indevido), e nenhum pedido de desculpas, embora no sábado pela manhã Henry B. Eyring, o terceiro membro da Primeira Presidência, tenha dito: “Um simples ‘desculpe-me’ pode curar feridas e convidar tanto perdão quanto amor.” Domingo à tarde, Oaks declarou: “Somos todos pecadores que podemos ser purificados pelo arrependimento”, mas caracterizou apenas aqueles que não compartilham de seus julgamentos como necessitados.
Por que esses homens não podem ouvir ou seguir seus próprios conselhos? A doutrina SUD rejeita explicitamente o conceito de infalibilidade profética – embora afirmando que Deus nunca permitiria que os profetas desviassem a igreja, uma contradição que um estudioso rotulou de “indesviabilidade”. Certamente a atual Primeira Presidência não dá nenhuma indicação de que eles acham que podem cometer erros.
No momento, estou lendo Os Próximos Mórmons: Como os Millennials Estão Mudando a Igreja SUD, uma análise de respostas a uma pesquisa de 2016 com 1156 mórmons e 540 ex-mórmons nos Estados Unidos. Publicado no início deste ano, provavelmente tem sido tanto alarmante como útil para os líderes em traçar uma trajetória para a igreja.
Fiquei espantada ao saber que, quando se tratava da POX, “71% dos mórmons atuais ou ‘fortemente’ ou ‘de certa forma’ concordaram com” rotular mórmons em casamentos do mesmo sexo como apóstatas, enquanto 51% dos mórmons ativos “fortemente” ou “de certa forma” concordaram que é correto e bom impedir que seus filhos sejam abençoados ou batizados (o que, reconhecidamente, significa que 49% não concordam, mas para mim ainda é um copo um pouco mais da metade vazio). Não é de se admirar que as sessões de sábado tenham instruído os mórmons a evitar julgar e rejeitar os entes queridos que são não-mórmons ou ex-mórmons: julgar e rejeitar eram precisamente os comportamentos que a POX modelava.
Pena que a mensagem de sábado foi minada pelo discurso de exclusão de Russell Nelson no domingo, cheio de advertências terríveis – para as pessoas que Nelson supostamente ama – que “o tempo está se esgotando” para obedecer ao ditame supostamente profético de Nelson. Caso contrário, as pessoas não serão exaltadas e ligadas a suas famílias para sempre.
A maioria das pessoas hoje considera aceitar e ser aceita por suas famílias como a base do comportamento moral, não sua recompensa. A moralidade brutal de Nelson tem a equação de trás para frente. Não apenas a administração de Trump, mas a igreja SUD também abraça uma política de separação familiar.
Em 2013, escrevendo sobre o bizarrice da igreja SUD e do governo dos Estados Unidos trocando posições sobre a legalidade de relações poligâmicas, eu invoquei a “ferida horrível que supura a psique SUD” e o trauma causado pela experiência sem graça da igreja com a poligamia.
A POX criou mais trauma e exacerbou aquela ferida hedionda, em parte porque tem as mesmas raízes: deificar a sexualidade masculina heterossexual branca e torná-la o princípio organizador do universo. Não é só que a teologia SUD faz de Deus um homem branco e hétero; é que, para a maior parte da história da igreja, ser um homem branco hétero era o maior modo de retidão e a recompensa por isso: homens gays justos seriam feito héteros na próxima vida; homens justos, negros ou pardos, seriam feito brancos; e as mulheres – bem, as mulheres sempre seriam mulheres, mas certamente teriam a sorte de serem parceiras subservientes e iguais em seus casamentos eternos.
Privilegiar a masculinidade, heterossexualidade e brancura como ideais supremamente valorizados pelo universo capacita aqueles que exemplificam esses ideais a governar todos os outros, aparentemente com impunidade: esses homens claramente se consideram isentos de uma característica principal de mordomia – responsabilidade por suas escolhas e pelo bem-estar de seus dependentes.
Eu escrevi uma vez sobre isso:
“A religião nos pede para determinar o que constitui bondade e justiça, e nos oferece padrões pelos quais fazer essas avaliações. Por exemplo, o mormonismo ensina que “quase todos os homens, tão logo suponham ter adquirido um pouco de autoridade, começ[am] a exercer imediatamente domínio injusto” – ou, em outras palavras, nossos líderes (religiosos e políticos) podem pecar. Jesus nos disse que “por seus frutos os conhecereis” – ou que as ações são julgadas por suas conseqüências.”
Se os líderes da igreja não desviaram as pessoas, eles ainda os prejudicaram, horrivelmente. Suas ações têm consequências devastadoras. Não é apenas correto, mas justo responsabilizar esses homens pelo modo como administraram sua mordomia. Eles nos devem, a todos nós, fazer melhor e dar o exemplo quando se trata de se arrepender e dizer: “Sinto muito”.
Holly Welker é uma poeta e ensaísta premiada que vive no Arizona. Seu trabalho já foi publicado no The New York Times, Dialogue: A Journal of Mormon Thought, Best American Essays, Religion Dispatches, entre outras publicações. Ela é a editora do livro Prestando Testemunho: 36 mulheres mórmons falam sobre amor, sexo e casamento.
A única pessoa que pode julgar e responsablizar se esses homens agiram certo ou errado dentro de suas mordomias é o próprio Jesus Cristo, não há ninguém neste mundo que tenha autoridade para tal.
Qualquer pessoa pensante tem o poder e o direito (“autoridade”) de julgar a ética e a moralidade do comportamento e dos ensinamentos de líderes públicos. Para esse fim nossos cérebros são imbuídos com a capacidade de raciocínio lógico e raciocínio crítico.
Ademais, todo o conceito filosófico de “livre arbítrio” depende inteiramente na capacidade neurológica de seres humanos de exercerem raciocínio lógico e raciocínio crítico. Seres vivos incapazes dessas habilidades neurocognitivas não exibem características de “livre arbítrio”.
Julgar, no contexto de ter sua própria opinião pelo fato narrado, qualquer um pode ter (eu mesmo tenho a minha e acho que deixar de ser apostasia o membro que tem um relacionamento homoafetivo foi errado), mas quem tem realmente autoridade para julgar e responsabilizar eles em suas mordomias é apenas Jesus.
Direito de ter sua opinião e autoridade para julgar são coisas beeem diferentes.
Basta imaginar quem pode julgar e condenar a prisão alguém em nossa sociedade? Qualquer pessoa ou um juiz de Direito?
Elementar…
Essa analogia de Juiz de Direito não poderia ser mais cretina. O que apenas reforça o cretinismo da sua posição inicial.
Um Juiz de Direito tem “autoridade” para julgar e condenar porque lhe é concedido essa “autoridade” dentro de um contexto jurídico. Pessoas pensantes, e nós retornamos ao conceito de pessoas pensantes, decidiram construir uma instituição fictícia e simbólica que representaria a vontade de um coletivo de pessoas pensantes: o Estado de Direito. Esse exercício de arbítrio (“pensantes”) cria o conceito abstrato de “autoridade” através da qual um Juiz de Direito, também uma figura filosófica abstrata realizada apenas pelo exercício de arbítrio intelectual, pode expressar e manifestar um desejo coletivo. Tal “autoridade” é aceita pelo coletivo única e expressamente na proporção em que ela foi inicialmente concedida, e rotineiramente aceitada, por tal coletivo.
Em suma, a “autoridade” de um Juiz de Direito existe apenas nas mentes das pessoas que compõe o coletivo onde tal Juiz de Direito exerce sua “autoridade”.
A “autoridade” que você atribui a Jesus é a sua crença religiosa pessoal, e você tem direito a sua crença religiosa pessoal, mas ela vem divorciada de qualquer atributo racional, lógico, ou factualmente comprovável. Você acredita nisso, pelo menos 5 bilhões de pessoas não acreditam, e sua crença não vem embasada em nenhum fato objetivo ou argumento racional. Creia no que quiser, mas não exige que outros creiam como você crê.
Sua crença religiosa pessoal sequer é compatível com os ensinamentos de Jesus, como descrito pelo Novo Testamento, que detestava líderes religiosos que impunham sofrimento e miséria no povo por causa de regras eclesiásticas arbitrárias.
Dito isso, o maior problema nos seus comentários acima (e nós já lhe explicamos isso em outras ocasiões) reside nesse seu desespero irracional para controlar a narrativa da discussão em torno do mormonismo. A autora acima julgou o comportamento dos líderes da Igreja SUD com argumentos racionais, lógicos, e éticos, e expressou eloqüentemente que é a crença religiosa pessoal dela que é imoral e antiético impor sofrimento psicológico em pessoas, famílias, e crianças por causa de regras arbitrárias e preconceito. E nós não lhe oferecemos “autoridade” de vir aqui questionar o direito dela de extender seu julgamento pessoal e expressar suas crenças pessoais. Não lhe explicaremos mais esse conceito, Lindomar.
(PS: De acordo com Brigham Young, Jesus Cristo não é “a única pessoa que pode julgar”.)
“Pena que a mensagem de sábado foi minada pelo discurso de exclusão de Russell Nelson no domingo, cheio de advertências terríveis – para as pessoas que Nelson supostamente ama – que “o tempo está se esgotando” para obedecer ao ditame supostamente profético de Nelson. Caso contrário, as pessoas não serão exaltadas e ligadas a suas famílias para sempre”
O discurso de domingo do Pres. Nelson nunca foi de exclusão, pelo contrário, foi de inclusão, chamando todos a firmarem os mais altos convênios com Deus para poderem receber o mais alto galardão.
Ele chama a todos sem excluir ninguém.
E faz seu dever de profeta em alertar o povo sobre o que podem perder em não firmar os convênios.
Nada de errado.
Se você parar para pensar antes de escrever, Lindomar, talvez aprenda algo algum dia ao invés de ficar regurgitando apologéticas mal formadas.
O discurso de Nelson foi de exclusão porque ele insistiu que Deus discrimina contra pessoas por suas identidades pessoais, e não apenas os julga por seus comportamentos. Nelson insiste em regras diferentes para pessoas diferentes baseado em nada além das características pessoas com as quais elas nasceram e foram criadas.