Uma frase a menos sobre o Manifesto

A Primeira Presidência que aprovou o Manifesto: Presidente Wilford Woodruff (centro) com seus conselheiros George Q. Cannon (esq.) e Joseph F. Smith (dir.)
As novas edições das escrituras SUD em português, lançadas no mês passado, seguem as mudanças feitas em inglês no ano de 2013. Dessa forma, o cabeçalho da Declaração Oficial 2, por exemplo, passa a incorporar a informação de que a exclusão de negros do sacerdócio mórmon não foi iniciada por Joseph Smith.
Declaração Oficial 1
Outra importante mudança em Doutrina e Convênios ocorreu na edição inglesa online em setembro de 2014: na Declaração Oficial 1, foi retirada a frase “[o] voto para apoiar a moção foi unânime”. No mês seguinte à edição, o site oficial da Igreja publicava em inglês um ensaio sobre o fim da prática do casamento plural, onde eram mencionadas abstenções durante a Conferência Geral que aprovara o Manifesto: “a maioria votou a favor, embora houvesse abstenções”.
Voto fraco
Em 06 de outubro de 1890, após décadas sendo ensinados sobre a necessidade de “fazer as obras de Abraão”, mórmons – mesmo que majoritariamente monogâmicos -estavam inseguros com a proposta de abandonar o princípio do matrimônio plural. “Pareceu-me o pior momento da minha vida”, escreveu o setenta B. H. Roberts sobre a votação do Manifesto. Relatos históricos falam de abstenção por parte da maioria dos presentes e de pelo menos um voto em contrário:
William Gibson, poteriormente deputado no legislativo de Utah, votou contra: “Não me envergonho da minha ação a respeito do manifesto. Votei ‘não’ na conferência. Quando George Q. Cannon anunciou um voto homogêneo [unânime], eu disse ‘Todos menos um bem aqui.’ Devemos deixar a Babilônia agir da sua maneira por um tempo, suponho.” A maioria da congregação recusou-se a votar quando o Manifesto foi apresentado, resultado sobre o qual o Apóstolo Merrill observou “foi apoiado por um voto fraco, mas aparentemente unânime”, Joseph H. Dean registrou “muitos dos santos abstiveram-se de votar de uma forma ou de outra”, e Thomas Broadbent notou “achei uma votação muito magra, considerando a multidão reunida.”¹
Quando o Manifesto virou escritura
Dezoito anos e um segundo manifesto depois, a Declaração Oficial foi discreta e timidamente transformada em escritura, como o último item de Doutrina e Convênios. O documento estava distante das duas grandes divisões do livro – as Palestras Sobre a Fé e os Convênios e Mandamentos – e colocado após um índex e uma concordância. E nele estava a afirmação sobre o voto unânime – que perdura em todas as edições atuais do livro, com exceção das versões digitais em inglês e português.
Honestidade e lentidão
Para uma igreja que preza tanto a uniformidade, a situação criada é um tanto insólita: membros de um ramo hispânico em Utah estarão com sua edição desatualizada das obras-padrão, enquanto seus vizinhos anglo-saxônicos terão a nova edição; brasileiros em um ramo de Nagoya terão a versão atualizada, enquanto seus correligionários japoneses terão a antiga.
Retirar a afirmação de voto unânime representa, em minha opinião, um pequeno mas significativo avanço por parte da Igreja SUD rumo a uma maior honestidade com esse importante e persistente capítulo da história mórmon. Por outro lado, também nos mostra o processo lento pelo qual a sede da Igreja disponibiliza e correlaciona informações a leitores e membros em sua periferia linguística.
Referência
1. D. Michael Quinn. LDS Church Authority and New Plural Marriages, 1890-1904. Dialogue 18:01 (Spring 1985), p. 48.
Uma versão anterior deste artigo foi publicada em inglês no blog Peculiar People.
Sinceramente, tenho dificuldade em crer e aceitar que uma Igreja que se diz única e verdadeira na face da terra não use de transparência e honestidade ao tratar de seus assuntos doutrinários equivocados.
Lisiane, não tenho certeza se você está se referindo à afirmação de voto unânime ou à retirada da afirmação ou à prática do casamento plural ou ao abandono da prática.
Quando o Pres. Woodruff apresentou o manifesto ao Quorum dos doze, a aprovação foi unânime. Apenas na Conferência é que houveram abstenções por parte de alguns membros que lá estavam. Não vejo problema algum em não ter sido relatado tais abstenções.
Sim, Marco. No entanto, eu faria duas observações: (1) a aprovação por parte dos Doze foi do documento e não pode ser confundida com a aprovação do fim do casamento plural; e mesmo essa aprovação não foi livre de reservas e conflitos pessoais; (2) o Manifesto foi enviado à imprensa antes de ser apresentado aos Doze – estratégia que pode ter contribuído para a unanimidade dos apóstolos.