Vaza Documento Interno da Igreja Mórmon

Um funcionário d’A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias vazou ao público um documento interno de um comitê nos escritórios gerais da Igreja.

Prédio dos Escritórios da Igreja, em Salt Lake City, Utah.

Prédio dos Escritórios da Igreja, em Salt Lake City, Utah.

O documento em si é inócuo e nada mais demonstra além da pauta de uma reunião. O surpreendente nele é, além da admissão franca de alguns problemas que parecem ser tabus em público, o que ele revela que a Igreja está tentando esconder de seus membros.

O documento inclui apenas duas páginas de uma reunião de um comitê burocrático no famoso Prédio dos Escritórios da Igreja, a literal sede da Igreja SUD, voltada para planejamento estratégico sobre como lidar com questões LGBT. A missão desta “força-tarefa” é:

Coordenar o trabalho de múltiplos departamentos no que diz respeito a mensagens e produtos sobre atração do mesmo sexo (e assuntos relacionados, como identidade sexual, e casamento do mesmo sexo).

Ajudar os membros a entender as questões, ajudar líderes a ministrar a indivíduos e suas famílias, e assegurar que as mensagens estão unificadas e coerentes.

A força-tarefa é composta por 12 membros:

  1. Élder Randall K. Bennett;
  2. Larry Richman;
  3. Brittany Beattie;
  4. Mark Beck;
  5. Bryce Anderson;
  6. Dave Clare;
  7. Justin McPheters;
  8. Rebecca Taylor;
  9. Dave Biesinger;
  10. Steve Kohlert;
  11. Justin Lether;
  12. Kimball Ungerman.

A reunião supostamente ocorreu no dia 01 de junho p.p.,  e a primeira página consiste na pauta geral dessa reunião [foto da página 1 aqui].

A reunião coloca em pauta discussões sobre planos e estratégias para o futuro próximo em como abordar o assunto LGBT. O comitê planejou artigos para a revista Ensign [a equivalente americana à Liahona], novos manuais específicos como o “Um Guia Para Pais”, aulas específicas para os manuais dominicais de 2017 (aulas de 5° domingo), atualizações para o panfleto “Para o Vigor da Juventude”, atualizações para o site mormonsandgays, materiais para treinamento de lideranças locais, materiais para treinamento de professores de seminário e instituto, materiais para treinamento de missionários, e como consolidar todos os materiais para fácil e rápido acesso.

Além da óbvia falta de liderança de peso (dos 12 membros, o comitê é graceado apenas com uma Autoridade Geral, e ainda assim um Setenta júnior do 2° Quórum), três coisas imediamente saltam aos olhos nessa página.

A primeira é extremamente positiva. A Igreja demonstra preocupação em deixar claro que homossexualidade não está ligada à pedofilia. Essa admissão não pode ser menosprezada, considerando que muitos membros, e até algumas Autoridades Gerais, pensavam e ainda pensam essa absurdidade fantástica e sem base em fatos ou na realidade.

A segunda é neutra. A Igreja é gerenciada por um aparato burocrático extenso, e muitas decisões editoriais e educacionais sobre materiais didáticos e teológicos são tomadas em infindáveis comitês equipados por profissionais de carreira. Essa importante faceta da Igreja Mórmon, muitas vezes obscurecida dos membros pela distância dos processos decisórios e pelo repetido mantra “a Igreja é guiada por revelação”, fica muito bem ilustrada na pauta de reunião deste comitê.

A terceira, contudo, é negativa. O comitê, e consequentemente a Igreja, está planejando utilizar como ferramentas de apoio aos membros organizações reconhecidamente homofóbicas ou secretamente controladas pela própria Igreja.

Explicamos.

Em primeiro lugar, a Igreja incluirá referência, a título de oferecer suporte e apoio adicional, um grupo de “suporte” para homossexuais mórmons que até alguns anos oferecia “cura gay”, e ainda hoje é criticado por profissionais de saúde por defender práticas discriminatórias contra gays. Além disso, alguns dos links oferecidos levam a notórios grupos de ódio, e um dos manuais preconiza terapia de conversão ou a popular “cura gay”.

Em segundo lugar, a Igreja incluirá referência a um grupo de “suporte” que seria “independente” e “gerenciada por membros”, mas que é obviamente um site da Igreja! O site em questão pagou para manter privado (e secreto) quem é seu dono, mas ele foi desenhado por uma empresa cujo dono não só é funcionário da Igreja, mas é funcionário de alto escalão: Diretor do Departamento do Sacerdócio e Família. A grande maioria do conteúdo desse site “independente” e “gerenciado por membros” é republicação e/ou tradução de textos e vídeos e imagens produzidos pela Igreja, e para os quais ela mantém direitos autorais exclusivos.

A Igreja abusa da credulidade ao sugerir que ela não tem controle, total ou parcial, de um site que nada mais oferece do que conteúdo que ela própria gera, gerenciado por uma empresa cujo dono é seu funcionário executivo de alto escalão.

Qual seria, então, a vantagem para a Igreja mentir de maneira tão flagrante?

 ∼¤∼

A segunda página que vazou dessa reunião é muito mais encorajante [foto da página 2 aqui]. Apresentando fatos concretos e estatísticos aos membros do comitê, essa página admite que a Igreja tem um problema grave de depressão e suicídio entre jovens SUD, conforme nós havíamos relatado em três artigos recentes (de janeiro aqui, de fevereiro aqui, e de março aqui):

  • Utah tem a quinta maior taxa de suicídio de jovens nos EUA;
  • Suicídio é a causa número 1 de óbitos entre jovens em Utah;
  • Minoriais sexuais e de gênero são 4 vezes mais propensas à suicídio;
  • 62% dos jovens de Utah que são minoriais sexuais ou de gênero relatam haver tentado suicídio;
  • 85% dos jovens que são minoriais sexuais ou de gênero relatam sofrer bullying, por pares, por professores, e por líderes eclesiásticos;
  • A maioria dos membros SUD que são minorias sexuais ou de gênero apresentam taxas anormalmente altas para suicídio, ideação suicida, depressão, ansiedade, alienação e ostracismo da família e dos membros da Igreja.

A admissão desse grave problema não é um passo a ser ignorado. Além de ser de fundamental importância para resolução de qualquer problema, primeiro a sua admissão e a tentativa de sua compreensão. Muitos SUD, a julgar pelos comentários que recebemos, preferem desacreditar que isso pudesse ocorrer nas comunidades mórmons, mas infelizmente vem acontecendo, e as políticas oficiais da Igreja apenas agravam a crise. Reconhecê-la, portanto, é um primeiro passo na direção de uma solução, e isso deve ser reconhecido.


Leia mais sobre a Proposição 8.

Leia mais sobre discriminação oficial pela Igreja SUD.

Leia mais sobre associação de Igreja com grupos de ódio.

Leia mais sobre reações da Igreja com controvérsias legais.

12 comentários sobre “Vaza Documento Interno da Igreja Mórmon

  1. No último parágrafo, linha 8 é preciso retirar um “r” de ocorrrer (sic). Gostaria também de deixar um sugestão, puramente mecânica, mas que eu penso que facilitará a leitura dos artigos. Eu, e acredito que a maioria dos leitores, apreciam o conteúdo do site através principalmente de smartphones e na maioria da vezes os assuntos exigem bastante reflexão e retorno ao texto para compreensão; devido a esses dois motivos seria muito útil se as linhas dos textos passassem a ser numeradas, talvez de 5 em 5 linhas; isso facilitaria a análise em meio a correria do cotidiano.

  2. Penso que é de grande valia a igreja ter em seu corpo eclesiástico profissionais de diferentes áreas.Como diz em D&C, também podemos conjugar as inspirações juntamente com o “melhores livros” e “estudos”.Ainda tenho críticas á politica da igreja se portando como o governo americano nos anos 50/60 com respeito a ameaça comunista e a perseguição implacável com dispêndio oneroso de recursos que poderiam ser melhor aproveitados. Ainda creio que a mansidão e discrição em cada caso individual sejam as melhores ferramentas para ensinar pessoas com tendencias homossexuais.A imposição à força ou manipulada atrapalha o aprendizado e a espiritualidade. A falta de tato e caridade para com nosso irmão(ã)s que sentem atraídos por pessoas do mesmo sexo somente provoca conflitos desnecessários e direcionados para o lado incorreto. Oro para que nós como povo possamos amadurecer nessa questão.Se eu fosse o relações públicas da igreja eu iria focar no campanha de que nós temos a liberdade de falar da família tradicional e não o de combater de frente contra quem pensa diferente. Devemos defender a nossa liberdade e o livre pensamento, defender nosso espaço e não tentar destruir o alheio.

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