Publicamos um guia introdutório para a compreensão da teoria científica da dissonância cognitiva. Recebemos, felizmente, elogios sobre a qualidade e a didática do artigo, porém também recebemos críticas pelo seu tamanho.
Infelizmente, o assunto é complexo e, portanto, muito difícil de explorar de maneira sucinta enquanto compreensiva e explicativa. Por isso resolvemos investir algum tempo citando alguns exemplos ilustrativos para incentivar a ponderação e a investigação deste assunto, que invariavelmente afeta a todo ser humano.

Felizmente, nós recebemos muitas mensagens e comentários de mórmons zelosos que acham que precisam “defender a fé”.
Nossa proposta aqui no Vozes Mórmons é estimular discussões racionais e lógicas, baseadas em fatos e raciocínio crítico. Compreendemos o estresse emocional resultante da dissonância cognitiva que motiva pessoas a expressarem-se de maneira tão emotiva e irracional.
Por isso, publicaremos episodicamente algumas “pérolas” que recebemos para exemplificar e ilustrar expressões de dissonância cognitiva que não deveriam ser aceitos em nenhum contexto racional e lógico, mas que certamente são comuns no discurso coloquial. não são bem-vindos aqui. Fazemo-no na esperança de incentivar uma conscientização ampla desse problema psicológico universal, urgindo todos à reflexão ponderativa dos mecanismos típicos de dissonância, das reduções mais frequentes, e das ferramentas existentes para superá-las. [Leia sobre isso aqui]
Sem mais delongas, eis o exemplo de hoje:
Há três anos nós publicamos um artigo que, para qualquer leitor racional, é perfeitamente claro e inequívoco. Nele, mencionamos o curioso fato de que uma autoridade da Igreja SUD descreve a idade da Terra como 6 mil anos em contraposição a todas as evidências científicas em contrário.
O nosso comentarista do dia, contudo, não hesitou antes de deixar essa pérola:

“Me divirto com este site. É engraçado pegar só uma parte de uma ideia e criar uma conclusão sobre ela. Vamos ver o que o Elder Grahl conclui depois deste paragrafo (que vocês não colocaram):
“Esses estudiosos e cientistas cometem um erro primário. Eles confundem a idade da terra, a sua existência, a sua formação, com a existência do material com a qual ela foi formada.
A matéria utilizada por Deus para criar a terra seis mil anos atrás é que têm os tais milhões e bilhões de anos citados. Embora alguns elementos têm pouco tempo e se formaram durante a formação da terra e podem continuar se formando, como a água por exemplo que pode ser criada a qualquer momento, simplesmente a união do hidrogênio e oxigênio, temos, por outro lado matéria que foi utilizada para criação da terra com muitos mais tempo que tem sido citado e que qualquer pesquisado e cientista possam imaginar”A Terra tem 6 mil anos, mas a matéria que formou tem milhões e bilhoes” (sic)
Nosso intrépido comentarista, na pressa agonizante para resolver sua dissonância cognitiva, nos critica por propor uma conclusão apenas para demonstrar que a conclusão correta seria a mesma!
Vejamos como evoluiu seu pensamento:
Cognição #1: Nós publicamos que Autoridade SUD prega que a Terra tem 6 mil anos.
Cognição #2: Ciência demonstra que a Terra tem 4,5 bilhões de anos.
Cognição #3: Autoridades SUD falam em nome de Deus.
Cognição #4: Deus é perfeito e nunca erra.
A dissonância resulta do conflito entre essas 4 cognições na mente de nosso comentarista. Se #1, #2, #3 estiverem corretas, então #4 não está. Se #1, #2, e #4 estiverem corretas, então #3 não está. Se #1, #3, e #4 estiverem corretas, então #2 não está (mas a favor de #2 nós temos evidências tangíveis, dados mensuráveis e demonstráveis). E assim por diante.
Como ele tenta resolver essa dissonância? Ignorando #1, criticando o nosso relato das pregações dessa autoridade SUD:
“Me divirto com este site. É engraçado pegar só uma parte de uma ideia e criar uma conclusão sobre ela. Vamos ver o que o Elder Grahl conclui depois deste paragrafo (que vocês não colocaram):”
Não obstante o sarcasmo triunfal e a insinuação de deonestidade em nossa parte, ele então imediatamente demonstra que nós havíamos publicado a pregação do “Elder Grahl” (sic) corretamente:
A Terra tem 6 mil anos, mas a matéria que formou tem milhões e bilhoes” (sic)
Em resumo, nós afirmamos que Grahl pregara que a Terra tem 6 mil anos, o nosso confuso comentarista nos criticou por deturpar ou distorcer a “conclusão” de Grahl, e aí ele nos demonstra que Grahl havia pregado que “[a] Terra tem 6 mil anos…”, literalmente provando a nossa conclusão como correta.
A cognição #1 está correta, mas ele finge que não está, mesmo produzindo prova disso.
Dos 4 mecanismos de redução de dissonância cognitiva, nosso pioneiro comentarista qual ele exibiu? Dos 4 paradigmas de manisfestações de dissonância cognitiva, qual destes você consegue reconhecer no seu comentário? Qual seria uma resposta consonante adequada e racional que você lhe sugeriria? [Releia sobre esses mecanismos de redução e paradigmas de manisfestações de dissonância cognitiva aqui]
NOTA #1
É interessante notar que o nosso comentarista, assim como o Setenta Grahl, também demonstra profunda ignorância científica, completamente distorcendo a cognição #2. A datação da Terra se faz não apenas de aferições radiométricas de rochas isoladas (o provável alvo para o bizarro argumento que “a matéria que formou” a Terra seja mais velha), mas através de cálculos de velocidade de aposição e depósitos de camadas estratigráficas geológicas (i.e., quanto tempo demora para uma camada de rocha se apor sobre outra em estratos geológicos) , aferições radiométricas de meteoritos que impactaram na Terra e de rochas lunares, que apresentam composições químicas não afetadas pelas forças tectônicas e vulcânicas presentes na Terra, assim como cálculos das reações termonucleares do Sol em justaposição com sua presente massa e tamanho, e comparado com outro sóis, e mais recentemente, aferições de isótopos cosmogênicos (i.e., cicatrizes em rochas só possíveis por bombardeios com raios cósmicos) em rochas lunares e extraterrestres. A datação da Terra é feita através da confluência de dados de centenas de aferições diferentes e distintas, coletadas com métodos mutuamente independentes, e nenhum deles afetados pela “idade” da “matéria que formou”-a. Isso sem falar que hoje reconhecemos muito bem a evolução de formação da “matéria que formou” através de fusão nuclear nas fornalhas solares dos sóis e, especialmente, das supernovas. Mesmo que o nosso comentarista não tivesse comprovado o que nós havíamos atribuído ao Setenta brasileiro, ainda assim seus “argumentos” não tem nem semblança de plausibilidade científica ou racional. É mister notar que os físicos, geólogos, e biólogos da BYU rejeitam conceitos anticientíficos como o da “Terra Jovem”.
Errata: onde se lê “mitos”, leia-se “dogmas”. .