Dia dos Pioneiros em Utah Celebra a Jornada Mórmon ao Oeste – Mas Há Muito Mais na História dos Santos dos Últimos Dias e Migração

Jeffrey Turner

Todo dia 24 de julho, o estado de Utah celebra o “Dia dos Pioneiros”. Há desfiles, rodeios, fogos de artifício, maratona, caminhadas e trajes históricos, além de muito vermelho, branco e azul – semelhante ao 04 de julho e outros eventos patrióticos nos Estados Unidos.

Dia dos pioneiros Utah Mormonismo Brigham Young
Monumento intitulado Este é o Lugar, em um parque estadual na cidade de Salt Lake, Utah | Imagem: cortesia de Utah Historical Marks

O Dia dos Pioneiros, no entanto, comemora algo único: o dia em que migrantes mórmons chegaram ao Vale do Lago Salgado. O rótulo “mórmon” refere-se a qualquer igreja com raízes nos ensinamentos do fundador Joseph Smith, embora a maior delas, A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, tenha rejeitado o nome em anos recentes.

Os primeiros santos dos últimos dias a chegarem a Utah haviam fugido de Illinois, a mais de 1.600 quilômetros de distância. Em 24 de julho de 1847, depois de meses de jornada, o presidente da Igreja, Brigham Young, avistou o vale e proclamou: “Este é o lugar certo”.

Para santos dos últimos dias, o feriado envolve atividades da Igreja como palestras, danças, banquetes e às vezes a reencenaçāo das experiências dos pioneiros caminhando pela “Trilha Mórmon” com carrinhos de mão. Em Salt Lake City, há um grande desfile chamado “Dias de 47” com carros alegóricos que refletem um tema anual relacionado aos pioneiros.

Como historiador que estuda migração e imigração mórmons, vejo o aparato do Dia do Pioneiro como um reflexo das longas e complicadas relações da Igreja com raça, nacionalismo e identidade. As comemorações de cada ano enfatizam histórias de dificuldades e heroísmo. No entanto, relembram apenas uma dentre muitas histórias de migração na história diversa da Igreja e da região.

Igreja em movimento

Smith fundou a Igreja SUD no norte do estado de Nova York em 1830. Desde então, sua história tem sido uma história de movimento.

Smith afirmou ter recebido revelações e visões indicando que os santos dos últimos dias deveriam se reunir em preparação para a Segunda Vinda de Jesus Cristo. A Igreja ensinava que Deus coligaria seu povo em um lugar chamado Sião – uma palavra encontrada na Bíblia, muitas vezes usada para se referir a Jerusalém ou Israel – antes do retorno de Jesus. Ao converter as pessoas à Igreja SUD e incentivá-las a migrar juntas, os santos dos últimos dias do século 19 acreditavam que estavam construindo Sião.

Nas primeiras décadas da fé, a Igreja SUD mudou de sede várias vezes, reunindo-se em Nova York, depois em Ohio, depois no Missouri e depois em Illinois. A cada vez, sua chegada provocava conflitos com comunidades locais que não confiavam na nova igreja – discriminação que às vezes se transformava em violência. Depois que Smith, o fundador, foi morto por uma multidão local em 1844, Young liderou uma grande facção de mórmons na longa e difícil jornada para Utah.

Os anos no oeste

Quando santos dos últimos dias chegaram ao Vale Salgado em 1847, a regiāo era território do México. Os Estados Unidos ganharam controle do território no ano seguinte, como parte do Tratado de Guadalupe Hidalgo, o qual deu fim à Guerra Mexicano-Americana e cedeu terras no oeste aos Estados Unidos.

Levaria outra metade de século, porém, para Utah se tornar um estado dos EUA. O território estava tecnicamente sob controle dos EUA, mas, por ora, Santos dos Últimos Dias celebravam sua autonomia. Como parte do esforço para coligar os membros da Igreja, Young estabeleceu um sistema de microcrédito que financiava a migração de conversos de dentro e fora dos EUA a Utah.

Muitos não confiavam no governo dos EUA, dadas as experiências anteriores de discriminação da Igreja. Muitos americanos tampouco confiavam na Igreja SUD, em parte por causa da prática da poligamia – que os líderes da Igreja rejeitaram formalmente por volta da virada do século 20.

Alguns americanos no século 19 consideravam os imigrantes mórmons racialmente não-brancos, embora a grande maioria viesse da Europa. O sentimento anti-imigrante estava crescendo na época, e os críticos às vezes amalgamavam seus temores sobre imigrantes mórmons, chineses e muçulmanos.

O governo federal dos EUA tentou impedir a imigração mórmon de diversas maneiras, dentre elas, a partir de 1891, proibindo pessoas que apoiavam a poligamia de entrar no país. Mesmo assim, centenas de santos dos últimos dias imigravam a cada ano.

Histórias ofuscadas

As histórias de migração são uma fonte de orgulho e identidade para muitos moradores de Utah, e as comemorações do Dia dos Pioneiros têm uma longa história. Dois anos após a chegada dos primeiros santos dos últimos dias em 1847, eles começaram a celebrar o aniversário com saudações de canhão, música, toque de sinos e discursos.

As celebrações posteriores incluíam encenações. Para o 50º aniversário em 1897, alguns participantes reencenaram parte da caminhada ao longo da Trilha Mórmon e assistiram a uma procissão de carroças e carros alegóricos puxados por cavalos, uma tradição que gradualmente se formalizou no desfile dos Dias de 47.

Para alguns, o Dia dos Pioneiros simboliza exclusão e esquecimento – especialmente o impacto da igreja sobre os nativos americanos. Em um artigo de opinião de 2019, o documentarista Angelo Baca e a historiadora Erika Bsumek escreveram que o Dia dos Pioneiros “representa um momento chave na história da colonização do oeste americano”, que fez com que “Utes, Paiutes, Shoshone, Goshute e Navajos” perdessem “suas casas, terras e até, em alguns casos, suas famílias”.

O Dia dos Pioneiros também é o aniversário da chegada de pessoas negras, tanto escravizadas quanto livres, cujas experiências muitas vezes têm sido negligenciadas na história de Utah. No entanto, monumentos e registros escritos ajudaram a desencadear discussões sobre como lembrar seu legado durante o feriado.

À medida que o perfil de santos dos últimos dias se tornou mais globalmente diversificado, as celebrações do Dia dos Pioneiros têm incluído narrativas pioneiras mais diversificadas da história da fé. Nos últimos anos, os programas da Igreja também enfatizam histórias de como os “pioneiros” estão estabelecendo a fé em todo o mundo, não apenas em Utah.

À medida que Utah e a Igreja continuam a se tornar mais diversificadas, os participantes do Dia dos Pioneiros continuarão a recuperar histórias de migração, deslocamento e coragem que moldam sua identidade no presente por meio de suas lembranças do passado.


Jeffrey Turner é doutorando em História norte-americana, na Universidade de Utah. Ele pesquisa história da imigração, história religiosa americana e história do oeste americano.

Artigo originalmente publicado aqui. Reproduzido com permissão.

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