Quem Eu Acho Que Sou?

Texto por Kristy Money

“Sinto muito por ela, ela deve se sentir bem envergonhada. Ela deve se achar muito de si se acha que é o papel dela criticar a Igreja. Quem ela acha que é, mesmo?”

Este é o comentário mais recente que recebi da minha comunidade SUD depois que saiu um artigo no The New York Times com a minha história, junto com as incríveis histórias de várias mulheres  SUD, falando sobre as experiências delas na Igreja. Recebi este comentário simplesmente por contar minha história, a história de querer segurar minha filhinha recém-nascida enquanto ela fosse abençoada na capela pelo meu marido, e tive este desejo recusado por meu bispo, mesmo que tal pedido nem seja contra o Manual Geral de Instruções.

Também saiu no artigo esta foto de mim com minha filhinha, Rosemary.

Também saiu, no artigo do The New York Times, esta foto minha, com a minha filhinha Rosemary.

Sei que não estou sozinha em receber críticas como esta: sei que muitas outras feministas SUD já foram mal-entendidas e já receberam comentários como este desde antes de eu nascer. Mas sou mais ou menos recém-chegada à comunidade feminista SUD, e à organização Ordene as Mulheres (no original, ‘Ordain Women’), à qual pertenço. Só vai fazer seu primeiro aniversário este mês. Então, mesmo que talvez devesse esperar tal reação, eu não tinha me preparado o suficiente para poder ler tais comentários sem realmente senti-los na pele. Comentários dizendo que estou praticando artimanhas sacerdotais, que sou apóstata, que estou enraivecendo Deus ao expressar meu desejo de segurar minha filhinha com orgulho e amor enquanto ela recebe um nome e uma benção na capela.

É verdade que meu coração praticamente saltou do meu peito quando primeiro vi minha foto e li o meu nome num jornal tão proeminente, mas não acho que este tipo de vergonha é o que esta irmã queria dizer com o seu comentário. Senti-me bem mais envergonhada quando estava no escritório do meu bispo, implorando para poder segurar minha Rosinha durante sua benção.

Abordei meu bispo com este pedido justamente porque eu sabia que ele é um homem justo, um homem bondoso, que fez questão de fazer amizade conosco quando nos mudamos pra sua ala, que parecia talvez um pouco menos rígido do que muitos outros bispos. Por exemplo, o filme preferido dele é ‘O Poderoso Chefão‘. Pensei que talvez ele estaria aberto à ideia, mesmo que fosse um pouco heterodoxa.

Ele disse que sentia muito, mas sua resposta era não. A explicação dele era que “o Manual Geral de Instruções diz claramente que somente portadores do Sacerdócio de Melquisedeque podem participar.”

Em minha voz mais educada, perguntei-lhe se ele estaria disposto a pedir permissão do Presidente de Estaca, especialmente quando um diácono tradicionalmente segura o microfone durante tal tipo de benção, e ele tampouco tem o Sacerdócio maior. Perguntei assim: “Se ele pode segurar o microfone sem o Sacerdócio de Melquisedeque, posso segurar a Rosie da mesma forma?” Eu não estaria participando na ordenança mais que o diácono, ou mais que a cadeira na qual eu estaria sentada. Ele me respondeu que sim, estava disposto a perguntar, mas logo me trouxe a mesma resposta: Não.

Gentilmente, perguntei-lhe outra vez, desta vez tentando apelar ao seu coração, compartilhando alguns dos meus sentimentos mais sinceros. Contei-lhe a história de quando, certa vez, eu estava no consultório do médico pediatra da minha filha e vi um bebezinho cair ao chão e bater a cabeça. O som da batida da cabeça com o chão, o olhar de terror na cara da mãe quando se deu conta de que seu filhinho não estava mais seguro no seu carrinho — eu simplesmente não conseguia tirar este som e esta imagem da minha mente. Sinceramente, eu tinha medo de que alguma coisa parecida pudesse ocorrer com um monte de homens balançando minha filha na frente da capela. Perguntei se existia alguma maneira dele acomodar minhas preocupações e nervos como mãe. Ele me disse não outra vez, arrematando que não queria criar precedentes para outros casos possíveis. Depois da nossa conversa, saí do bispado, achei uma sala vazia, sentei-me e chorei.

No fim das contas, abençoamos Rosinha na casa da minha avó, à beira-mar. No lar onde minha mãe fora criada. A casa onde meus pais celebraram seu casamento. O lugar sagrado onde minha avó me segurava como recém-nascida, onde ela me ajudou a soprar as velas dos meus bolos de aniversário, onde passei parte da minha lua-de-mel com meu marido enquanto minha avó ficava na casa dos meus pais, onde passei as primeiras horas do nascimento da Rosinha após chegar do hospital.

Abençoamos Rosinha num domingo de Páscoa, uma celebração do seu nascimento justamente no dia do renascimento do Salvador. Foi uma experiência espiritual, sagrada e marcante que nunca vou esquecer, sagrada até demais para contar em detalhes aqui. Só digo que, enquanto segurava minha filhinha preciosa e ímpar, meu marido abençoou-a para ser forte e corajosa, sempre lembrando que ela é uma filha querida de Pais Celestiais.

Espero ser forte assim também, por Rosinha e por sua irmã mais velha Evangelina, mês que vem na Conferência Geral quando eu vou, junto com as minhas irmãs de ‘Ordene as Mulheres‘ para o Centro de Conferências em Lago Salgado, chegar às portas durante a Sessão do Sacerdócio, para bater e pedir entrada assim como o Salvador faz no coração de cada um de nós.

Quem eu acho que eu sou? Não sou famosa. Sou a mulher na sua ala tentando me virar na reunião sacramental com crianças pequenas. Sou alguém que ama seu marido fortemente, que considera o dia um sucesso se as crianças comem o suficiente e não saem de casa peladas rua à fora. Procurei estudar porque creio na escritura que diz que “a glória de Deus é inteligência”. Também sou psicóloga, e escolhi este profissão em grande parte por querer poder “chorar com os que choram… e consolar os que necessitam de consolo”.

Sou uma mulher SUD, e não me acho diferente de ninguém. Nem acho que eu seja muito diferente das mulheres que me criticam, como a mulher que fez aquele comentário inicial. Mas, sim, sou diferente num sentido: Creio e oro para que as mulheres possam ser ordenadas ao Sacerdócio.

Se você tem sentimentos parecidos, e talvez queira compartilhar tais sentimentos num perfil do site ‘Ordene as Mulheres‘ (assim como nossas irmãs MicheleGraciela, e Deborah), pode aprender mais fazendo contato neste e-mail: profile@ordainwomen.org.

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39 comentários sobre “Quem Eu Acho Que Sou?

  1. Gostei muito deste artigo e ao ler este tipo de situação, posso refletir as palavras do templo .No templo sinto que as mulheres realmente se portam como companheiras dos homens dentro de sua esfera de atuação , não vejo competição no templo , ouço nas ordenanças, promessas maravilhosas para as mulheres, as oficiantes são sensíveis e educadas, não sinto o espirito de que as mulheres querem tomar o lugar dos homens , mas que querem estabelecer seu espaço com mais confiança e determinação.O fato de segurar a criança na benção, foi algo que poderia trazer mais alegria para a mãe e para a criança, que estaria mais confortável com a mãe no momento da ordenança,o cenário poderia ficar até mais bonito com o pai ao lado abençoando , uma digna cena de família eterna! Como tudo tem seu tempo , a cultura social SUD também amadurece com passar dos anos , sou otimista na conquista das mulheres no seu desafio de ocupar mais espaço, sem competiação claro , mas sendo muito mais companheira no sacerdócio do que já é , o fato de quebrarmos o paradigma de vermos mulheres mais atuantes com o sacerdócio, somente fortalece o aspecto de companherismo e trabalho em família.Minha pergunta é : Chegaremos a ver o dia de ver o pai e a mãe ordenando o filho no sacerdócio aaronico?veremos mulheres preparando o sacramento? Vejo isso mais como uma ajuda e apoio que como uma ameaça.Outro ponto positivo seria um maior fortalecimento no caráter dos filhos que aprenderiam trabalhar em equipe , assim como seu pai convive com sua mãe , dividindo responsabilidades. A Questão é …separar demasiadamente as atividades e responsabiliadades na familia usando o parametro de gênero sexual ajuda ou prejudica? Obvio que a natureza e pontos positivos no caráter de genero diferem ao exercer responsabilidades,contudo no mundo moderno a linha já não esta aparecendo tanto.A Liderança SUD está ciente e acompanhando o processo? Como eles estão lidando com isso ao se dirigir ao Senhor?

    • Fico feliz com o seu comentário, Otavio–também sinto que estas perguntas representam uma ajuda possível à Igreja, não uma ameaça.

      Acho que o discurso de Élder Andersen na última conferência geral demonstra que estão pensando ao respeito–e ele só diz que não sabemos o porque da divisão entre os sexos com respeito ao sacerdócio. Se não sabemos, então é possível a entrada de mais luz e conhecimento neste assunto. Aguardo este dia com prazer!

      -Kristy Money

      • Sua história é linda e emocionante, a reação das pessoas foi lamentável e elas tinham todo o direito de ter opinião contra, mas não podiam ter te julgado e condenado. O sacerdócio como está na Igreja hoje será que foi determinado por homem ou por Deus?
        Se foi por homem, mude já! Se foi por Deus, então que permaneça assim mesmo que desagrade a muitos. Eu pessoalmente acredito que foi Deus, mas o tempo dirá se estou errado e se eu estiver serei o primeiro a reconhecer isso e pedir desculpa as mulheres.
        Uma das referências que me fazem acreditar que foi por Deus, é a passagem a seguir, em que Elisa R. Snow relata parte de um discurso de Joseph Smith:

        “Eliza R. Snow relatou: “[Joseph Smith deu] instruções a res- peito dos diferentes ofícios e a necessidade de cada pessoa agir dentro da esfera que lhe foi atribuída e cumprir os diversos ofícios para os quais for indicada. Ele falou da tendência de muitos homens de considerar desonrosos os ofícios menores da Igreja e de invejar a situação de outros que são chamados para presidi- los; disse que era insensatez e desvario do coração humano uma pessoa aspirar a outros cargos além daqueles para os quais foi indicado por Deus a ocupar; e que era melhor que a pessoa magnificasse seu respectivo chamado. (…) Todos devem ter como única aspiração magnificar seu próprio ofício e chamado”.16” (Ensinamentos dos Presidentes da Igreja -Joseph Smith-Capítulo 8, página 117)

  2. Kristy, não acho que nós mulheres precisamos ser ordenadas ao sacerdócio, sinceramente, acho que já o temos sem precisarmos sermos ordenadas( temos uma ligação imensa com o pai celestial e poderes grandiosos), mas fiquei muito decepcionada por não deixarem você segurar seu bebê em sua apresentação, a minha última filha não queria ficar no colo do pai na apresentação e eu sem problemas nenhum segurei ela no colo. Outra coisa curiosa e que ja causou confusão na minha ala foi que eu lendo livros da igreja achei um relato do presidente Josefh F, Smith, onde ele conta que certa vez foi dar uma benção de saude em um de seus filhos, sua esposa colocou também as mão sobre a cabeça do filho, não agindo com o sacerdócio e sim com a fé. Já faz muito tempo que li isso, não me lembro em qual livro foi, mas ano passado minha filha de 16 anos estava doente e pediu uma benção ao meu esposo e na hora que ele ía começar a benção, eu fui impulsionada e inspirada à acompanhá-lo na benção (agindo com minha fé e não com autoridade do sacerdócio), impondo também as minhas mãos sobre sua cabeça. Isso causou grande tumulto na ala quando meu esposo numa aula relatou tal história, mas meu presidente da estaca concordou comigo que foi um momento de inspiração, fui movida pelo espirito e não há mal nisso. Mas novamente repito, na minha opinião, nós mulheres não precisamos receber o sacerdócio, se formos fiéis somos capazes de operar milagres grandiosos!

    • Karla, também acho que há muitas mudanças pequenas que seriam positivas mesmo sem ordenação de mulheres (como a possibilidade de segurar seu bebê na benção). Também já ouvi falar de casos de bispos que deixaram–infelizmente este é um dos resultados de ter uma liderança voluntária sem muito treinamento, é que há muita variação do que é tolerado em cada ala. Meu marido sempre diz que, já que nós como membros não podemos fazer o Jogo do Bicho, esta variação entre os líderes locais é nossa maneira mórmon de apostar, “o Jogo do Bispo.” 🙂

      Achei muito bonita a sua história de abençoar sua criança. Um dos motivos porque apoio a idéia de ordenar as mulheres é que, dependendo da sua liderança local, este tipo de atividade poderia levar você a ser disciplinada! Isso não aconteceria se as mulheres poderiam ser ordenadas.

      -Kristy Money

      • Kristy, gostei muito da sua história. Você é muito inteligente. Adorei especialmente a parte em que você cita a escritura, porque é uma das que mais gosto. Passei a amar o estudo por causa dessa escritura, e é uma experiência bacana que ainda pretendo relatar aqui.

        Uma das maneiras mais impactantes de uma mulher mostrar que ela se “iguala” ao homem, em temos de valores, é quando ela busca conhecimento incessantemente. O conhecimento, ao meu ver, é uma das chaves para que o Sacerdócio se estenda tanto a homens quanto a mulheres, já que a inteligência, como você citou, é a glória de Deus. Dessa forma, creio que, de certo modo, já temos todas as condições de portar o Sacerdócio, assim como qualquer pessoa, seja homem ou mulher. Do mesmo modo que acredito que muitos homens não o podem portar, visto que têm uma visão muitíssimo limitada da eternidade. Mas vou parar por aqui para não falar muita bobagem.

        Só terminando, o que creio ter acontecido no seu caso, foi uma pura obstinação de liderança, quero dizer com isso que o conservadorismo do bispo foi o que acabou determinando essa discussão, porque em minha ala, e em várias outras pelas quais passei, quase todas as crianças são abençoadas no colo das mães, e nunca houve discussão por isso. Às vezes os líderes ficam tão obcecados em mostrar sua autoridade que esquecem que o Evangelho é muito mais amor e menos tirania. Enfim, acredito que somos portadoras do Sacerdócio, quem sabe de um jeito não tão claro quanto acontece com os homens, e por isso, sentimo-nos um tanto inferiores às vezes, mas temos um poder grandioso também, que só pode ser o poder de nosso Pai Celestial, ou mais provavelmente, de nossa Mãe.

        Adorei seu artigo.
        Um beijão no seu coração.
        Márcia

    • Sim você pode pode participar de uma benção quando convidada pelo portador do sacerdócio, da mesma maneira em que um homem sem sacerdócio também pode também,
      Para você entender melhor isto se encontra em Doutrina de Salvação III,pg 179

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