Crescimento da Igreja Mórmon (2014)

“Estamos reunidos juntos como uma grande família, mais de 15 milhões [de membros] fortes…”, disse Thomas Monson durante a abertura da última Conferência Geral neste fim de semana que passou. Com esta frase, o Presidente da Igreja SUD nos convida a revisitar uma análise estatística de como anda o crescimento da Igreja e ponderar justamente como enxergamos, compreendemos e utilizamos este conhecimento matemático.

Thomas Monson estabelece um número

Thomas Monson estabelece uma afirmação estatística (checável) em plena Conferência Geral

Tal entusiasmo estatístico não é incomum entre a liderança da Igreja. Na Conferência Geral de 2007 (Outubro), o Apóstolo Russell Ballard alardeou: “Como uma das fés Cristãs que cresce mais rápido no mundo, construímos uma capela nova todo dia de trabalho.”

E entre publicações recentes nos jornais oficiais da Igreja há muitos artigos que reforçam essa percepção, além do próprio escritório de relações públicas da Igreja. Lendo as publicações da Igreja e os discursos em Conferência Geral, tem-se a impressão de que a liderança está bastante otimista com o rápido crescimento da Igreja pelo mundo.

Não obstante tal otimismo, em Outubro de 2012 o mesmo Presidente Monson anunciou o rebaixamento da idade mínima para serviço missionário (de 19 para 18 anos para meninos, e de 21 para 19 anos para as meninas) em parte, de acordo com o Apóstolo Jeffrey Holland, para que “Deus … apress[e] Sua obra…”.

Em plena Conferência Geral, o atual Presidente da Igreja estabeleceu uma afirmação clara e inequívoca que pode ser testada, analisada e checada. No mesmo dia, a Igreja apresentou seus novos dados estatísticos para o ano de 2013. Com estes dados novos, além dos dados já oficialmente publicados pela Igreja nos anos anteriores, e comparados com dados populacionais de vários censos, pode-se checar e confirmar a afirmação do Profeta Mórmon e responder — e levantar — algumas perguntas.

A primeira, e mais importante, questão é: Como realmente anda o crescimento da Igreja?

Em Abril de 2012, eu tracei uma retrospectiva do crescimento da Igreja SUD entre 1981 e 2011, com base nos dados estatísticos publicados pela própria Igreja, e comparando-os com estatísticas populacionais mundiais. Os dados oficiais da Igreja para 2012 e 2013 apresentando-se dentro das mesmas tendências gerais, sem grandes mudanças.

Tabela de Estatísticas da Igreja SUD entre 1981 e 2013 (Clique na imagem para amplia-la).

Tabela de Estatísticas da Igreja SUD entre 1981 e 2013 (Clique na imagem para amplia-la).

Computados os dados oficiais da Igreja de total de membros por ano, podemos rastrear as taxas de crescimento anual da Igreja. Vemos então que, nos últimos 30 anos a taxa média de crescimento caiu de 5-6% ao ano nos anos 80, para 3-4% nos anos 90, 2-3% 14 anos, e entre 2-2,5% na última década.

Além de ser notável a redução progressiva na taxa de crescimento total, nós sabemos por estudos populacionais independentes que a taxa real de membros (em atividade ou por auto-identificação) é bem, bem menor que as taxas oficiais computadas pela Igreja — que costuma contar como membros todas pessoas batizadas ou abençoadas quando crianças, até 120 anos de idade ou falecimento confirmado. O que torna o número total de membros uma ferramenta para rastreamento de crescimento menos confiável.

Como anda o crescimento das unidades da Igreja?

Não obstante, podemos rastrear a taxa de crescimento de novas unidades (alas e ramos), pois em média estas necessitam de números de participantes ativos médios razoávelmente estáveis e comparáveis. Quanto usamos os dados oficiais para rastrear o crescimento da Igreja pela taxa de crescimento anual de unidades, vemos que a Igreja crescia entre 2,5% e 5% ao ano nos anos 80, entre 2,5% e 6% ao ano nos anos 90, e entre 0,5% e 1,6% ao ano nos últimos 15 anos.

Quando ploteamos esses dados num gráfico, uma tendência para redução de crescimento torna-se bastante aparente!

Crescimento da Igreja SUD, baseado em estatísticas oficiais de membros (taxa calculada anual de crescimento de número total de membros) AZUL, e de unidades (taxa calculada anual de crescimento de número total de alas e ramos) VERMELHO; comparação com taxa de crescimento populacional do mundo (Banco Mundial) VERDE.

Crescimento da Igreja SUD, baseado em estatísticas oficiais de membros (taxa calculada anual de crescimento de número total de membros) AZUL, e de unidades (taxa calculada anual de crescimento de número total de alas e ramos) VERMELHO; comparação com taxa de crescimento populacional do mundo (Banco Mundial) VERDE.

Se olharmos com um pouco mais de atenção para os últimos 15 anos, esta tendência torna-se ainda mais óbvia.

Crescimento da Igreja SUD, baseado em estatísticas oficiais de membros (taxa calculada anual de crescimento de número total de membros) AZUL, e de unidades (taxa calculada anual de crescimento de número total de alas e ramos) VERMELHO; comparação com taxa de crescimento populacional do mundo (Banco Mundial) VERDE.

Crescimento da Igreja SUD, baseado em estatísticas oficiais de membros (taxa calculada anual de crescimento de número total de membros) AZUL, e de unidades (taxa calculada anual de crescimento de número total de alas e ramos) VERMELHO; comparação com taxa de crescimento populacional do mundo (Banco Mundial) VERDE.

Vê-se, portanto, que a Igreja crescia bastante até 1998, com crescimento de membros bem acima do crescimento populacional global, mas que esse ritmo caiu bastante e progressivamente de 1999 para cá. Além disso, nota-se que o crescimento, como medido em unidades ou congregações, está abaixo do crescimento populacional de 1999 para cá, dando a entender que a Igreja cresce apenas em têrmos de taxas de reposição, ou até negativamente.

Que fique claro que os dados não dizem que a Igreja esta reduzindo de tamanho total! Há sem dúvidas mais Mórmons hoje que há 2 anos atrás, ou 5 anos ou 10, ou 20. Mas, os dados sugerem que a Igreja esta reduzindo de tamanho em proporção ao mundo ao seu redor.

Como cresce a Igreja em seu país natal dos Estados Unidos?

Os Estados Unidos vem mantendo uma taxa de crescimento populacional razoavelmente estável entre 0,85 e 0,95% ao ano.

A Igreja nos Estados Unidos crescia, em média, entre 1 e 4% ao ano nos anos 70, 1 e 4% ao ano nos anos 80 (com dois picos anômalos), 2 e 3% nos anos 90, e 2% na última década.

Então a Igreja cresce acima do crescimento populacional nos EUA?

Não exatamente. Estas taxas acima são dos números oficias de membros, que estudos independentes colocam entre 40 e 70% da real taxa demográfica de Mórmons. Por exemplo, o estudo independente ARIS demonstra que a população SUD nos Estados Unidos mantém-se estável (crescimento zero) em proporção à população Americana desde 1990 (1,4%).

Sendo assim, há dados que sugerem um crescimento pequeno, e há dados que sugerem um crescimento nulo nos últimos 20 anos nos EUA.

Como anda a obra missionária? Qual o impacto dela nisso tudo?

O gráfico é um pouco difícil de visualizar, mas mostra claramente que a taxa de conversos por missionários esta razoavelmente estável nos últimos 30 anos, entre 4 e 6 por ano por missionário. Quando se aumenta o número de missionários, aumenta-se o número de batismos proporcionalmente, e ambas taxas vem se mantido moderadamente estáveis, com a média anual de missionários na casa dos 50 000 e conversos na casa dos 280 000. Contudo, como discutido acima, há 18 meses a Igreja reduziu a idade mínima para serviço missionário, o que resultou num aumento súbito de missionários no camp0 de 58 990 no final de 2012 para 83 035 no final de 2013. Não obstante, a taxa de batismos de conversos manteve-se no mesmo nível que nos últimos 25 anos (sendo que a taxa de batismo por missionário caiu para um recorde histórico negativo).

Dez anos antes desta mudança, a Igreja havia anunciado uma política que reduziria o número de missionários no campo, por aumentar o grau de exigência para o serviço. Os resultados, como se pode ver, foram desastrosos e a Igreja vem lutando desde então para reverte-lo, culminando com esta mudança mais recente (10 anos após a outra). Entretanto, apesar do súbito crescimento de missionários totais no campo, ainda não houve comparável crescimento na taxa de conversos e batismos.

Considerando todos os dados estatísticos disponíveis, nota-se que a Igreja vem, há décadas, sofrendo de redução progressiva na taxa de crescimento. Sob alguns prismas, a Igreja tem crescimento nulo, apenas repondo suas perdas naturais (deserções e óbitos). Sob outros prismas, a Igreja cresce muito pouco acima do crescimento populacional natural, e sob outro (análise de crescimento de unidades) ela cresce abaixo do crescimento populacional (crescimento negativo). Sob nenhuma consideração pode-se dizer, baseando-se nos dados concretos, que a Igreja esteja crescendo bem.

E a questão dos “15 milhões [de membros] fortes…” de Thomas Monson?

Se considerarmos as estimativas conservadoras e otimistas de 1,4% da população americana (4 400 000), de 50% da população SUD fora dos EUA e de 25% de auto-identificação lá (2 000 000 — baseado em estudos brasileiros, chilenos, mexicanos, e filipenhos), deve haver uns 6,5 milhões de SUD nominais pelo mundo afora, ou pouco mais que 40% do que Monson alardeou neste fim de semana. Isto, considerando que estas estimativas são conservadoras e generosas, pois os números reais podem bem ser até menores — especialmente levando em consideração que destes ainda há muitos SUD que são inativos mais ainda se consideram Mórmons, e o fato de que em qualquer congregação SUD a porcentagem de membros dizimistas integrais e templários é usualmente pequeno comparado ao número de membros moderada ou intermitentemente ativos.

Conclusão

Tudo analisado, calculado e estimado, pode-se dizer que a declaração de Monson seja uma grosseira exageração, possivelmente para fins propagandistas ou de ânimos coletivos. Pode-se também dizer que o crescimento da Igreja é, de fato, um problema considerável, especialmente para um igreja que investe tanto em proselitismo. Tamanha preocupação explicaria as recentes mudanças experimentais com a força missionária e campanhas publicitárias multimilionárias.

Certamente a liderança máxima da Igreja têm acesso a dados estatísticos muito mais acurados e relevantes do que os que publicam e conseguem enxergar o problema com mais clareza. Entre os dados que seriam relevantes, eles sabem quantas pessoas frequentam as reuniões dominicais, quantas pessoas pagam seus dízimos mensalmente, quantas pessoas possuem uma recomendação ao templo, e quantos pedidos de resignações a Igreja recebe por ano. Independente da falta de transparência com o público, é certo que tenham tais dados e que não ignorem o tamanho ou a profundidade do problema. Resta, portanto, a dúvida de como aborda-lo da maneira mais eficaz e mais produtiva possível. Talvez investir em missionários de campo (i.e., vendedores de porta a porta) ou campanhas publicitárias não seja a melhor estratégia — ao menos não parece estar oferecendo bons retornos ao investimentos. Talvez investir em campanhas políticas preconceituosas e shoppings de luxo tampouco ajuda a projetar uma imagem pública com apelo religioso e espiritual.

Se você fosse o Presidente da Igreja, o que você faria para tentar reverter este quadro negativo e fomentar um crescimento mais robusto e duradouro? E, aproveitando, seria aberto e transparente com o problema de crescimento pífio ou tentaria esconde-lo ou mascara-lo com declarações bombásticas de números irreais?

 

 

 

54 comentários sobre “Crescimento da Igreja Mórmon (2014)

  1. Esta virou a grande questão da Presidência de Área: “Contagem de pessoas na sacramental”. Podem acreditar! Os bispos estão recebendo uma pesquisa para preencher e, em vários treinamentos de liderança estão ensinando a fazer a contagem. Chegaram a conclusão que o número de batismos e de visitantes são suficientes para aumentar, e muito os números domingueiros, com isso estão sem saber dar explicações para Salt Lake.
    Foi-nos pedido que contássemos desde o primeiro até o último banco, que era para andar mesmo pela sacramental, depois sair pelos corredores, salas e banheiro. Não podemos perder nenhum na contagem! São preciosos ao Senhor! Sei!
    Querem cobrir uma fria realidade: as pessoas não querem saber da Igreja. A retenção é medíocre diante da mediocridade de batismos.
    Fui abordado recentemente por uma pessoa que queria fazer uma entrega na capela e ele me disse: Uma igreja tão bonita e abandonada! Por que vocês fecharam?
    Nossa fé se concentra no domingo pela manhã! São poucas as exceções de algo realmente edificante em outro dia da semana. (futebol, reuniões de integração idiotas e algumas entrevistas e mutuais) Prédios lindos, porém frios na fé, no calor humano, na devoção e adoração viva. Mecânicos! Nos tornamos mecânicos e capitalistas na nossa fé americana. Não podemos nem ser descontraídos e espontâneos como bons brasileiros que somos. Temos que nos conduzir por números, relatórios, material de treinamento engessado e a repetição da mesma coisa dia após dia. Resultado: Naufrágio, barco à deriva ou indo a pique…

      • incrível como isso é comum em praticamente todas as alas. Como militar, já conheci bastante do Brasil de Manaus até Rio Grande do Sul. Onde chego é a mesma coisa. Não sei como é nos outros países, pois ainda não tive essa oportunidade, mas aqui a realidade é simplesmente relatórios, material de treinamento engessado e repetições da mesma coisa dia após dia. Fico muito triste, pois durante a semana não há nada nos prédios da igreja que incentive os membros a sair da segurança de seus lares a noite, se arriscar, para ir a igreja e encontrar cinco pessoas na capela, uma esperando pela outra, olhando para cada do outro, a não ser uma entrevista marcada com o bispo, ou um futebol na quadra. Não vemos uma atividade realmente espiritual. Interessante que, em outras denominações, a qualquer hora que as portas se abrem, vc vê os membros orando, louvando, chorando, sorrindo e falando de Cristo, pensando em Cristo. Nas alas vemos os irmão conversando, as irmão limpando os armários e as crianças sem opção. Amo Jesus Cristo, sei que ele está vendo tudo e lamentando a perda de tempo.

      • Aqui na ala também Suzana. Frequência no domingo de 25 a 30 . Em conferência de estaca a capela fica cheia , mas segundo a liderança , em torno de cento e poucos.

  2. A declaração feita pelo Pres. Monson não é uma “grosseira exageração”, é claro que essa informação refere-se ao número absoluto de pessoas cadastradas como membros da Igreja.
    Essa informação é extraída diretamente do sistema da Igreja (MLS) , então totalmente verificável.
    Nessa afirmação, ele não fez distinção entre fortes e fracos, que se declaram SUDs ou não, dizimistas ou não, portadores de recomendação ou não.
    Seria interessante se ele informasse também quantas pessoas foram batizadas post mortem

    • Rafael, talvez você não tenha lido a primeira sentença do texto acima, onde cito Thomas Monson: “Estamos reunidos juntos como uma grande família, mais de 15 milhões [de membros] fortes…” (ênfase minha). Caso prefira ler no original: “We are gathered together as a great family, more than 15 million strong…” (ênfase minha).

      Ninguém aqui acredita que Monson tenha se referido a qualquer outra base de dados que a MLS. Mas a inferência da frase de Monson, cuidadosamente escolhida e preparada bem antes da Conferência, é obviamente dar a impressão de que a Igreja têm “mais de 15 milhões” de membros “fortes”.

      Como você deve ter lido no texto acima, os dados estatísticos, aos quais Monson também tem acesso, mais da metade destes 15 milhões sequer se consideram Mórmons mais. Como você deve ter lido nos comentários acima, dos que sobram muitos (maioria?) não são ativos. Como, então, não ler desonestidade publicitária na declaração de Monson?

      • É importante registrar que no discurso de abertura, proferido por Monson, não houve a tradução da palavra forte, nem pelo intérprete, nem no artigo traduzido que está disponível no site da Igreja.

        O discurso original, como foi dito por Monson: “We are gathered together as a great family, more than 15 million strong […]” foi traduzido por: “Estamos reunidos como uma grande família de mais de 15 milhões de pessoas […].

        Uma vez que o intérprete não mencionou a palavra “forte” no momento em que discursava Monson, podemos questionar se no texto referente ao discurso anteriormente mencionado, havia previamente a referência dessa palavra ou se a mesma foi improvisada, ou mesmo como disse Marcello, cuidadosamente escolhida e preparada bem antes da Conferência.

      • Muito interessante, Josimar. Obrigado por esta observação. Eu não estava ciente.

        Nós recebemos os textos preparados antes dos discursos, nos pacotes distribuídos para os tradutores e para a mídia pelo Departamento de Relações Públicos. O texto pré-aprovado lê: “more than 15 million strong”.

      • Marcello, data maxima venia, a tradução correta da frase “15 million strong” não é “15 milhões [de membros] fortes”, mas sim “forte de 15 milhões [de membros]”. É uma construção correta, mesmo que pouco conhecida e usada fora de um contexto mais erudito, da língua inglesa.

      • Marcus Tullius, você tem toda a licença do mundo para me corrigir sempre que eu estiver errado, mas infelizmente neste caso você está completamente equivocado.

        A expressão “strong” utilizada para números e contingentes é uma expressão comum em jargão militar e denota “efetivos”. Por exemplo, afirmar que um regimento tem 5 000 “efetivos” significa que ele possui 5 000 combatentes, além dos adjuvantes (i.e., cozinheiros, faxineiros, enfermeiros, etc.). Este é o significado de “strong” neste contexto.

        Quando Monson usa a expressão “strong”, ele está insinuando que a Igreja SUD tem 15 milhões de membros ativos, crentes, fiéis. Caso quisesse ser mais cauteloso com seu linguajar, ele poderia ter qualificado seus comentários com “15 milhões de membros cadastrados ou em registro”, mas ele preferiu “strong”. Não, a expressão escolhida “15 million strong” sugere 15 milhões de membros ativamente participativos na Igreja, como combatantes em seus postos.

        Sim, eu poderia ter traduzido “efetivos” mas, como qualquer pessoa fluente em 2 ou mais línguas e adepta a traduções sabe, a arte da tradução consiste em transferir significados contextualizados claramente e não apenas transubstanciar uma palavra n’outra. (E eu estava com preguiça de ter que explicar justamente o que lhe expliquei agora…)

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