Ordenanças do templo – parte 6

Círculos de oração, vestimentas e altares

Joseph Smith (1805-1844)

Joseph Smith (1805-1844)

Iniciadas por Joseph Smith em maio de 1842, as cerimônias da investidura continham, como parte da “comunicação das chaves pertencentes ao Sacerdócio“, instruções  sobre uma forma ritual de oração,  chamada de “verdadeira ordem de oração”.  Quando realizada em grupo,  era muita vezes chamada de “círculo de oração”.

“Não sabíamos como orar”

A verdadeira ordem de oração incluía gestos e palavras sagradas.  Segundo o relato do então secretário do Profeta, William Clayton, pelo menos uma das palavras teria sido vista em uma de suas pedras de vidente:

ele [Joseph Smith] a respeito das palavras-chave.  A g. [grande] palavra-chave foi a primeira palavra que Adão falou é uma palavra de súplica.  Ele encontrou a palavra pelo Urim e Tumim. [1]

Há duas fontes históricas contemporâneas que podem ter influenciado Joseph Smith na busca da verdadeira ordem de oração: o protestantismo e a maçonaria.

Reunião durante o

Reunião durante o “Segundo Grande Despertar”.

Em algumas expressões do revivalismo protestante, participantes das reuniões ao ar livre muitas vezes formavam um círculo parar orar. Como escreveu um observador:

quando o convite era feito, havia uma corrida geral, o grande anel de oração era preenchido e por pelo menos duas horas oração ardente subia ao céu. [2]  

As reuniões campais e a diversidade de doutrinas e práticas religiosas dos diversos grupos influenciaram o adolescente Joseph Smith na inquietação espiritual que o levou à Primeira Visão, entre seus 14 e 16 anos.

Paralelamente ao revivalismo protestante, a maçonaria era uma forte influência cultural à época. Determinado ritual maçônico é descrito da seguinte forma:

Os irmãos se reúnem em torno do altar, e formam um círculo, em pé em tal posição que tocam um ao outro, deixando espaço  para o Venerável Mestre [que] ajoelha, dá as mãos aos outros, fechando o círculo. [3]

Não há certeza se Joseph Smith teria visto ou participada de tal ritual em específico. No entanto, sua longa associação com maçons e anti-maçons,  e seu ingresso na loja de Nauvoo, com os diversos empréstimos subsequentes do simbolismo maçônico, sugerem tal possibilidade.

O primeiro uso de uma formação em círculo para oração coletiva ocorreu na Escola dos Profetas, em Kirtland, em 1833. De acordo com o relato de Zebedee Coltrin, Joseph Smith havia instruído os membros da escola a

ajoelharem e orarem com as mãos levantadas. (…) Mais ou menos na época em que a escola foi primeiramente organizada, alguns desejavam ver um anjo, e um número [deles] juntou-se em círculo e orou. Quando a visão veio, dois dos irmãos se encolheram e pediram para a visão se fechar ou iriam perecer. [4]

A oração coletiva, com os participantes em círculo, porém, não parece ter sido rotineira, nem ritualizada, antes da instituição da investidura em Nauvoo, em 1842. E com a ministração da investidura a mulheres, em 1843, a verdadeira ordem de oração encontrava seu desenvolvimento completo. Na mesma reunião em que mulheres foram incluídas e em que recebeu, ao lado de Emma Smith, sua segunda unção, Joseph Smith liderou o novo Quórum em oração:

Presidente conduziu em oração para que seus dias sejam prolongados, tenha domínio sobre seus inimigos, todos os lares sejam abençoados e toda igreja e o mundo. [5]

Membros do Quórum dos Ungidos  reuniam-se regularmente para realizar seus círculos de oração. Eles também foram autorizados a oferecer a verdadeira ordem de oração fora de suas reuniões.

As afirmações de Batsheba Smith sobre aquele período nos sugerem o significado dado à verdadeira ordem de oração pelos que recebiam a investidura:

Bathsheba Smith (1822-1910)

Bathsheba Smith (1822-1910)

Falando em uma das nossas reuniões gerais de jejum, ele [Joseph Smith] disse que não sabíamos como orar para ter nossas orações respondidas. Mas quando eu e meu marido tivemos nossas investiduras (…), Joseph presidindo, ele nos ensinou a ordem de oração. [6]

A verdadeira ordem de oração tinha o objetivo de trazer conforto e revelação divina aos seus praticantes. Trabalhando na capital norte-americana pela campanha presidencial de Joseph Smith, Heber C. Kimball relatou:

Noite passada, eu me vesti e ofereci os sinais do Santo Sacerdócio e clamei ao nome do Senhor. Ele me ouviu, pois meu coração foi confortado. [7]

Vestes sacerdotais

O uso constante de uma vestimenta sacerdotal, recebida na investidura, estaria também relacionado à possibilidade de usar a verdadeira ordem de oração em qualquer lugar. Em uma reunião do templo de Nauvoo, o apóstolo George A. Smith dirigiu-se àqueles que já haviam recebido suas investiduras, relacionando o uso dessas vestimentas (garments é a palavra inglesa usada por Smith) à verdadeira ordem de oração:

Quando oramos ao Senhor, devemos nos reunir vestidos com vestimentas adequadas e quando assim o fazemos, e unimos nossos corações e mãos juntas, e agimos como uma mente, o Senhor responderá nossas orações. Nossas vestimentas devem ser marcadas adequadamente e devemos entender essas marcas e devemos vestir essas vestimentas continuamente, de dia e de noite, na prisão ou livres e se os demônios nos cortarem em pedaços, que cortem as vestimentas também. Se tivermos as vestimentas sobre nós todo o tempo, poderemos a qualquer momento oferecer os sinais. (…) Ele então disse que quando tinham uma oportunidade, eles [George A. Smith e Wilford Woodruff] se retiravam para um lugar isolado ou um sótão e então ofereciam os sinais e eram sempre respondidos. Seria bom para nós colocar as vestimentas todos os dias e orar a Deus, e em círculos privados, quando pudermos fazer isso em segurança. [8] [grifo nosso]

Anúncio da empresa The Reliable (

Anúncio da empresa The Reliable (“A Confiável”) publicado na década de 1920 em periódicos da Igreja SUD.

A “vestimenta do sacerdócio”, que originalmente cobria completamente braços e pernas, bem como as demais roupas usadas na investidura, eram confeccionadas pelos próprios iniciados ou outros. No início do séc. XX, surgiram em Utah empresas privadas que competiam no mercado de garments. Levariam décadas para que sua Igreja SUD viesse a monopolizar a fabricação e venda.

Fim dos círculos de oração

A longa e rica história dos círculos de oração na Igreja SUD só foi interrompida pela Primeira Presidência  em junho de 1978, quando foi proibida a prática da verdadeira ordem de oração fora dos templo e restrita às sessões da investidura.

Altares

Elaborado altar em exposição no Museu de História da Igreja, em Salt Lake.

Elaborado altar em exposição no Museu de História da Igreja, em Salt Lake.

Assim como roupas usadas com uma finalidade espiritual, outro importante objeto dos rituais templários também fazia parte do cotidiano mórmon do séc. XIX: o altar. Com ele, não apenas haveria o cenário ideal para realizar a verdadeira ordem de oração como mesmo os que não haviam recebido sua investidura teriam o benefício de utilizá-lo. De acordo com Joseph F. Smith,

(…) é absolutamente necessário que os Santos dos Últimos Dias se reúnam como família e ajoelhando ao redor do altar, clamem a Deus por Suas bênçãos de manhã e à noite. [9]

Segundo o apóstolo George Teasdale, o altar seria um item necessário em cada lar mórmon:

George Teasdale (1831-1907)

George Teasdale (1831-1907)

O altar familiar deve estar na casa de todo homem (…). Ele deve oferecer a oração; sua esposa e filhos também devem oferecer a oração alternadamente ao redor do altar familiar. Você não pode ser um santo sem a companhia do Espírito de Deus. [10]


NOTAS

1. William Clayton em 15 de junho de 1844. George D. Smith (ed.) An intimate chronicle: the journals of William Clayton. Signature. Salt Lake, 1995. p.133-134.  Devido à ambiguidade na escrita, é também possível que Clayton estivesse afirmando que Adão encontrou a palavra no Urim e Tumim.

2. Rev. James Erwin, Reminiscences of Early Circuit Life (Toledo, Ohio: Spear,Johnson & Co., 1884), p. 68. Citado por D. Michael Quinn. Latter-Day Prayer Circles. BYU Studies 19:1, 1979, p. 02.

3. David Bernard, Light on Masonry: A Collection of All the Most Important Docu-ments on the Subject of Speculative Free Masonry (Utica, N.Y.: William Williams, 1829), p. 116–117. Citado por Quinn, ibidem.

4. Ata da Escola dos Profetas, Salt Lake City, 11 de de outubro de 1883, p. 69. Citado por Quinn, idem.

5. Diário de Joseph Smith em 28 de setembro de 1843. Citado por Anderson e Bergera. Joseph Smith’s Quorum of the Anointed, 1842-1845. A documentary history. Signature. Salt Lake: 2005. p. 25.

6. Juvenile Instructor vol. 27, p. 345.

7. Diário de Heber C. Kimball em 06 de junho de 1844.  Citado por Quinn, idem.

8. George A. Smith, de acordo com o relato de Wiliam Clayton, ibidem, p. 221.

9. Joseph F. Smith, 1881, Journal of Discourses 22, p. 47.

10. George Teasdale, Conference Report, October 1903, p. 51


Leia os posts anteriores desta série

Parte 1 – O Templo Antes dos Templos e os Precedentes para os Círculos de Oração

Parte 2 – O que significavam investidura e selamento para os mórmons na década de 1830?

Parte 3 – Simbolismo maçônico e o Ancião de Dias

Parte 4 – O Quórum dos Ungidos, a Investidura e as Segundas Unções

Parte 5 – No topo das montanhas

5 comentários sobre “Ordenanças do templo – parte 6

  1. Acredito que quando Jesus voltar e seu reino milenar se iniciar aqui na terra, ao contrario do que muitos pensam na Igreja, as diferentes formas de orar e adorar a Deus continuara, as escrituras afirmam que todo joelho se dobrara mas todos continuarao a ter a liberdade de se expressar da maneira que se sentir melhor, no reino celestial havera a perfeita forma de democracia. Nao me recordo se foi JS ou BY que ensinou algo assim. A ideia de que no milenio todos se converterao ao Mormonismo nao faz sentido e seria contrario ao livre arbitrio mas creio que todos ganharao um testemunho da expiacao e todos adoraram a Deus o pai e o Jesus o filho. Entao se olharmos atraves dessa otica nos podemos aceitar todas religioes e formas de adoracao sem preconceito contanto que elas elevem o ser humano a uma comunhao com Deus.

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