Igreja Mórmon Cede à Pressão, Reduz Discriminação

A Igreja Mórmon cede à pressão popular e externa, motivada por protestos de alunos e ex-alunos e uma investigação formal da OAB americana, e suaviza sua política discriminatória acadêmica em sua principal universidade, a Brigham Young University.

Prédio da Faculdade de Administração na Universidade de Brigham Young

Prédio da Faculdade de Administração na Universidade de Brigham Young

Entenda o caso:

O órgão público equivalente à OAB norte-americana, a American Bar Association (ABA, ou “associação de advogados americana”) abriu investigação formal sobre as práticas e políticas oficiais da universidade mórmon com relação à expulsão de alunos que abandonam a religião oficial da escola.

O chamado “código de honra” da BYU determina que alunos que não sejam membros da Igreja SUD, ou que sejam de outras religiões, ou que não pertençam a nenhuma fé específica, possam estudar lá normalmente e converter-se à fé mórmon em qualquer momento de sua vida acadêmica sem problemas.

Contudo, se um aluno é membro da Igreja SUD e expressa o desejo de mudar de fé, ele(a) pode ser expulso(a) imediatamente.

ONG defende alunos

Uma ONG chamada FreeBYU (ou “BYU Livre”) está determinada a mudar essa política. Caleb Chamberlain, fundador da FreeBYU e ex-aluno explica:

“Há muitos alunos estudando na BYU atualmente que simplesmente escondem suas mudanças de fé, por pura necessidade, caso desejem formar-se. No meio do meu mestrado eu corria o risco de não poder me formar apenas por estar passando por uma transição na minha fé.”

No ano passado, quase 3 mil pessoas assinaram uma petição protestando a faculdade de direito da BYU por violar as explícitas regras éticas da ABA ao discriminar contra alunos LGBT ou contra alunos que mudaram de crenças ou afiliações religiosas. Consequentemente, a ABA enviou um investigador para entrevistar alunos e administradores e determinar se há descumprimento ético por parte da faculdade mórmon, e depois enviar as recomendações apropriadas para o comitê de acreditação do órgão.

Antes de 1993, a universidade aceitava alunos membros e não membros da Igreja igualmente, apenas distinguindo-os nos valores das mensalidades cobradas. Em 1993, porém, a universidade alterou sua política oficial para permitir a expulsão de alunos que decidissem abandonar a fé mórmon. Estudiosos da história mórmon recente reconhecerão o ano como o mesmo em que a Igreja conduziu uma caça a bruxas contra intelectuais, excomungando e ameaçando com excomunhão vários membros fiéis simplesmente por serem acadêmicos e estudiosos.

A ONG ‘BYU Livre’ é composta por alunos, ex-alunos, e pais de alunos que desejam fomentar o espírito de liberdade religiosa dentro do contexto universitário da BYU, acreditando ser injusto punir alunos acadêmica, financeira, e profissionalmente por causa de suas crenças religiosas. O site da ‘BYU Livre’ oferece explicações básicas sobre como funciona, especificamente, esse tipo de discriminação religiosa, além de testemunhos de alunos que sofrem ou sofreram esse tipo de discriminação por parte da Universidade.

Igreja cede à pressão

A Igreja, através da administração de sua escola, decidiu alterar a política oficial da universidade assim que foi notificada da sindicância aberta na ABA, de maneira a permitir a possibilidade de exceção para alunos que optem por abandonar a fé mórmon.

Apesar de não clarificar exatamente como alunos possam avaliar-se dessa exceção clérica, de não extendê-la para as BYUs do Havaí e de Idaho (que não têm faculdades de direito) ou na Faculdade SUD de Administração, e de não especificá-la como uma regra automática para todos alunos, a ABA aceitou a alteração como suficiente para determinar que não haja discriminação suficiente para justificar maiores investigações e suspendeu a sindância.

Uma porta-voz da BYU elucidou que tais casos seriam todos avaliados individualmente, signalizando que embora teoricamente exista a possibilidade para que tais alunos protejam seus estudos e sua vida profissional de punição por suas crenças religiosas, ainda não existe ainda nenhuma regra clara, específica, e inequívoca salvaguardando suas liberdades religiosas dentro da comunidade educacional mórmon.

Não obstante tais obstáculos remanescentes, observadores comemoram a atitude da Igreja ao ceder, ao menos parcialmente, às pressões e aos argumentos da comunidade acadêmica.

Protestos

Convidado para discursar no Simpósio de Lei e Religião organizado pela BYU no ano passado, o professor de Sociologia da Universidade da Califórnia (Santa Bárbara) Mark Juergensmeyer cancelou de última hora sua palestra ao descobrir a política oficial da BYU proibindo alunos de se afastarem d’A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias.

Sociólogo cancela participação em simpósio da BYU sobre direitos religiosos ironicamente por causa da violação de direitos religiosos dos alunos pela própria BYU

Sociólogo cancela participação em simpósio da BYU sobre direitos religiosos, ironicamente por causa da violação de direitos religiosos dos alunos pela própria.

Em correspondência com o Centro Internacional para Lei e Religião da BYU, Juergensmeyer explicou sua consternação com a política da BYU de expulsar alunos que abandonam a fé:

“Eu decidi que seria hipócrita da minha parte participar de uma conferência em que a questão da liberdade religiosa é fundamental quando a instituição patrocinadora fundamentalmente viola este princípio em suas políticas com os estudantes mórmons.”

Segundo o site da BYU, o tema da conferência seria “Religião, Direito e Estabilidade Social.” Juergensmeyer disse que recusou o convite da universidade depois de saber da política de expulsão da escola, explicando:

“Pelo que entendi, não-mórmons são permitidos a se matricular na BYU, e são convidados a se converter à fé mórmon, se o desejarem, mas se os estudantes mórmons mudarem sua filiação religiosa eles perdem a suas bolsas de estudos, suas moradias no campus e seus empregos, e são expulsos da universidade, mesmo que estejam a meros meses de se formarem.”

A ‘BYU Livre‘ assumiu responsabilidade por contactar os oradores do simpósio incentivando-os a “tomar medidas para reformar a política da BYU de suspender e expulsar os estudantes SUD que mudam a sua fé”, de acordo com um post no site do grupo. De acordo com a ‘BYU Livre’, Juergensmeyer fora o único professor a responder, dizendo:

“Ao tomar esta decisão quero estabelecer que não tenciono nenhum desrespeito a você, ou ao Centro com o qual está filiado, ou os outros participantes na conferência desta semana. Sei que muitos membros do corpo docente da BYU se opõem a esta política e estão silenciosamente trabalhando para mudar isso. Eu os congratulo, e espero que a minha decisão seja aceita como um sinal de apoio para aqueles dentro da BYU que buscam mudanças. Eu aprecio seu dilema e admiro sua persistência.”

A ‘BYU Livre’ disse que os membros do corpo docente da BYU tentaram defender a política da escola com Juergensmeyer, que contra-argumentou:

“Pode haver argumentação legal para tal discriminação, mas é discriminação não obstante, e eu suspeito que se uma universidade em um país muçulmano expulsasse um aluno que quisesse se tornar mórmon, os administradores da BYU considerariam isso como uma violação da liberdade religiosa. E eles teriam razão.”

Contactada por repórteres, na época a BYU se pronunciou oficialmente, confirmando a política de expulsar alunos que abandonam a Igreja SUD, porém evitando abordar a contradição de não exigir o mesmo de alunos não-membros:

“Antes de serem admitidos à BYU, todos os alunos concordam em aderir ao ‘Código de Honra da BYU’… Para os membros d’A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias isso inclui seguir o valores e os padrões de sua religião. Por causa dos convênios e compromissos que membros da Igreja SUD fazem, eles são incapazes de estar em dia com o Código de Honra se decidem formalmente desafiliar-se da Igreja SUD. Todos os alunos devem estar em dia com o Código de Honra para se formarem e receberem seus diplomas e suas titulações.”

Contradição?

Ironicamente, liberdade religiosa é um princípio teoricamente defendido pela Igreja e seus líderes com frequência. O recém chamado Apóstolo Ronald Rasband recentemente discursou na própria BYU sobre o tema de liberdade religiosa:

“Se . . . eu estive disposto a morrer por um “Mórmon”. . . Estou tão pronto para morrer em defesa dos direitos de um presbiteriano, batista, ou um bom homem de qualquer outra denominação; pois o mesmo princípio que destruiria os direitos dos Santos dos Últimos Dias iria atropelar os direitos de. . . qualquer outra denominação que possa ser impopular e fraca demais para se defender.” [citando Joseph Smith]

Então, qual é a posição da Igreja sobre a liberdade religiosa? … Acreditamos na criação de um espaço para que todos possam viver a sua própria consciência sem infringir os direitos e a segurança dos outros. Quando os direitos de um grupo colidem contra os direitos dos outros, devemos seguir o princípio de ser o mais justo e sensível para tantas pessoas quanto possível. A Igreja crê e ensina equidade para todos.”

No início de 2015, reforçando o esforço de rebranding da cruzada anti-gay da Igreja SUD, o Apóstolo Dallin Oaks disse:

“Nós reivindicamos para todos o direito dado por Deus e constitucional para viver a sua fé de acordo com os ditames de sua própria consciência. Nós reconhecemos que a mesma liberdade de consciência deve se aplicar a homens e mulheres em todos os lugares para acompanhar a fé religiosa de sua escolha, ou mesmo nenhuma, se assim o desejarem.”

É a esperança do movimento ‘BYU Livre’ ver liberdade religiosa ser não apenas um princípio a ser ensinado pela Igreja, mas também vivido e praticado por ela. [Se você deseja apoiar a causa da ‘BYU Livre’, junte-se a outros membros da Igreja e assine o seu abaixo-assinado adereçado ao Presidente da Universidade de Brigham Young.]

6 comentários sobre “Igreja Mórmon Cede à Pressão, Reduz Discriminação

  1. Tenho concluido que a intenção da BYU não é educar, mesmo porquê a mesma não tem regras que punam professores que inssistem em humilhar alunos por causa de coisas pessoais. O objetivo é óbvio que é: 1- usar a universidade como meio de conseguir mais adeptos a fé Mormon e 2- fazer alunos viverem o modo de vida do membro Mormon.

  2. O que acho estranho é que pessoas veem muitas instituições de ensino como ótimas instituições de ensino mas as discriminam quando são instituições ligadas a instituições religiosas, e acreditam que tem o direito de impedir que estas instituições exijam de seus alunos que sigam seus preceitos religiosos. Em tais instituições, sejam elas católicas, adventistas, mormoms ou qualquer outra instituição cristã, só são instituições exemplares por defenderem os verdadeiros valores éticos e morais, e realmente todas estas instituições de uma certa forma discriminam aqueles que se ponham contra estes valores, mesmo que um dia de sua vidas os defenderam, mas resolveram mudar, mas imfelizmente as leis criadas pelos homens consideram este tipo de discriminação como um mal, porque perante a sociedade comum, moral tem ponto de vista, o que é imoral para alguns pode ser moralmente correto para outros, o que acontece é que no evangelho de Cristo o conceito de moral e ética são únicos e imutáveis. Pensar em pertencer a uma instituição de ensino religiosa para formar-se um profissional do mesmo nível que alguém que respeite e siga os ensinamentos e preceitos religiosos, combatemdo-os, é o o mesmo que pensar em salvação pelo simples fato de pertencer a uma instituição religiosa sem seguir seus mandamentos.

    • É inteiramente possível que você não tenha compreendido o artigo, Dagoberto. Apesar do artigo ser bastante claro e bem explicado, oferecemos abaixo um resumo para lhe ajudar a compreensão. Ainda assim, sugerimos que retorno ao artigo acima para lê-lo novamente.

      A BYU expulsava alunos por suas crenças religiosas. Caso eles fossem SUD ao começarem seus cursos e decidirem, enquanto estudam, que mudaram de crença ou fé e acreditam em outros dogmas ou outras religiões. A BYU tem o direito de discriminar contra a religião de quem ela quiser, enquanto instituição privada, porém ela não pode solicitar ou receber auxílio do governo enquanto discrimina contra as religiões de seus alunos, e sua faculdade de Direito pode perder a acreditação da prestigiosa Academia Americana de Advogados, que proíbe discriminação religiosa.

      Quando a mencionada academia (a versão americana da OAB) recebeu denúncia de tal discriminação, abriu sindicância. Em resposta, a BYU alterou as regras para não expulsar tais alunos automaticamente mas permitir-lhes um processo de revisão e apelação no sistema caso a caso. Mudaram-se as regras, porém não completamente.

      Acreditamos que agora fique ainda mais fácil para compreender a questão. Leia o artigo novamente com isso em mente.

      Abraços.

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