Suspense com Hugh Grant e Reality Show Focam em Estereótipos Sobre Mulheres Mórmons

Rebecca Janzen

Não costumo assistir a filmes no cinema, muito menos filmes de terror. Mas há algumas semanas, eu me vi assistindo a “Herege”, que me intrigou por motivos pessoais e profissionais.

No final dos anos 1990 e início dos anos 2000, assisti a muitas comédias românticas com Hugh Grant. Hoje, sou uma estudiosa de gênero, cultura e religião, incluindo o mormonismo. E em “Herege”, duas missionárias santos dos últimos dias batem em uma porta apenas para encontrá-la aberta por um personagem chamado Sr. Reed, interpretado por Grant.

Sentada no cinema, minha mente vagou para um tempo atrás, quando assisti a todo o reality showA Vida Secreta das Esposas Mórmons“.

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Em ‘Herege’, Missionárias Mórmons São Alvo de Terror

Filme de terror estrelado por Hugh Grant chega ao Brasil em novembro

A visita de missionárias SUD a um pesquisador altamente intelectualizado acaba virando um pesadelo de sobrevivência para a dupla. Esse é o tema de Herege, lançamento da produtora A24, renomada pelos títulos alternativos do seu catálogo.

Interpretando a dupla missionária estão as atrizes Sophie Thatcher e Chloe East, que curiosamente possuem raízes mórmons e cuja atuação parece convincente aos familiarizados com o proselitismo santo dos último dias.

No Brasil, Herege tem estreia prevista nos cinemas em 20 de novembro, de acordo com a distribuidora Diamond Films.

Como Setembro de 1993, Quando Líderes Santos dos Últimos Dias Disciplinaram Seis Dissidentes, Continua a Perturbar a Igreja

Benjamin Park

Lavina Fielding Anderson sabia que estava entregando uma bomba. Anderson, mórmon dedicada que havia anteriormente editado revistas da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, também era uma acadêmica, escritora e feminista. E naquele dia em agosto de 1992, ela estava fazendo uma apresentação de conferência detalhando como autoridades santos dos últimos dias silenciaram repetidamente congregantes dissidentes. Ela pontuou seus comentários com a revelação de que a igreja havia criado arquivos sobre membros que a criticaram publicamente – arquivos que um porta-voz mais tarde admitiu existirem.

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Morôni sem a trombeta. | Imagem: Beneathtimp, Wikimedia Commons

Treze meses depois, em setembro de 1993, seis intelectuais foram excomungados ou desassociados da fé, incluindo Anderson. O episódio em torno dos “Seis de Setembro”, como ficaram conhecidos, continua a ser um tema controverso nas comunidades SUD, especialmente porque muitas das tensões subjacentes permanecem até hoje.

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Celebração das Culturas Latinas na Igreja Mórmon Destaca Diversidade Ignorada

Brittany Romanello

Todo mês de novembro, desde 2002, a Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias realiza uma apresentaçāo anual chamada “Luz de las Naciones” ou “Luz das Nações”. Com um elenco de mais de 500 pessoas, a maioria das quais são membros latinos da igreja, o programa incorpora música, dança e mensagens espirituais em uma celebração da identidade latina em todas as culturas.

Apresentação de dança durante o programa Luz de las Naciones no Centro de Conferências de Salt Lake City, Utah, em 2 de novembro de 2019. | Imagem: cortesia de Intellectual Reserve Inc.

O tema para 2022 foi “Juntos es Mejor”, que significa “Melhor Juntos”. O programa gratuito é realizado no Centro de Conferências SUD Conference Center, ao norte da famosa Praça do Templo em Salt Lake City, Utah: sede da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, também conhecida historicamente como Igreja Mórmon ou SUD. Luz de las Naciones é a única celebração anual multilíngue e multicultural televisionada patrocinada pela sede da igreja.

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Kate Holbrook (1972-2022)

Com pesar, noticiamos o falecimento da historiadora Kate Holbrook, ocorrido no sábado passado (20/8), em Salt Lake City. Ela foi autora e/ou editora de diversos artigos, livros e apresentações relacionados à história das mulheres mórmons e à relação entre comida e comunidades religiosas.

Em 2011, Holbrook tornou-se a primeira historiadora gerente da História da Mulher no Departamento de História d’A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias. A posição inovadora conquistada por Holbrook gerou publicações que buscaram integrar a história das mulheres mórmons à narrativa oficial da maior denominação oriunda do movimento mórmon.

A historiadora Kate Holbrook, falecida em 20 de agosto de 2022. | Imagem: cortesia de kateholbrook.com

Em 2016, a Editora do Historiador da Igreja – uma das editoras oficiais da Igreja, até então dedicada exclusivamente ao Projeto Joseph Smith Papers – publicou o livro e o site coeditados por Kate Holbrook The First Fifty Years of Relief Society: Key Documents in Latter-Day Saint Women’s History (Os Primeiros Cinquenta Anos da Sociedade de Socorro: Documentos-chave na História das Mulheres Santos dos Últimos Dias), o qual permanece infelizmente sem tradução ao português.

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O Fascínio de Empresas como LuLaRoe Para Mulheres Santos dos Últimos Dias

O elo oculto entre a história das mulheres mórmons e leggings coloridas

Janiece Johnson

A imagem da capa da nova série de documentários “As Faces da Marca” [no original em inglês, “LuLaRich”] da Amazon Prime, mostra uma mulher com as mãos erguidas, como se estivesse orando ou louvando. O assunto da série não é abertamente religioso, no entanto. É sobre leggings.

DeAnne Brady Stidham, co-fundadora da empresa LuLaRoe, na capa do documentário “As Faces da Marca” | Imagem: cortesia da Amazon Prime Video, 2021

Ou, mais especificamente, sobre a venda de leggings. “As Faces da Marca” documenta a concepção e ascensão meteórica da LuLaRoe, uma empresa de vendas diretas ou marketing multinível (MMN) que gerou enormes lucros a seus proprietários e trouxe muitos milhares de pessoas, na maioria mulheres, a bordo para vender leggings e outras roupas coloridas para mulheres em suas próprias redes sociais.

No centro da história, estão atitudes sobre trabalho, gênero e o sonho americano. Mas outra parte, menos comentada sobre a saga da LuLaRoe e outros MMNs, é o seu lugar na história religiosa americana recente e, em particular, a maneira como essa empresa serviu-se da cultura d’A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias (SUD) para construir seu próprio poder.

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O Retrato de Jane Manning?

Nascida livre em Connecticut no início de 1820, Jane Elizabeth Manning James estava entre os migrantes que deixaram os Estados Unidos em 1847 e se estabeleceram no que hoje é o Estado de Utah. Não foi a primeira vez que Jane deixava sua casa para se juntar a um experimento utópico.

Como negra e mãe solteira, Jane ingressou no mormonismo em seu estado natal e mudou-se para Nauvoo, Illinois, onde trabalhou para Emma e Joseph Smith. Lá, recebeu a confiança suficiente do Profeta Mórmon e seu círculo interno para lavar suas “vestes do sacerdócio” e aprender com suas esposas sobre as inovações matrimoniais da nova religião. Se a cor de sua pele era uma barreira em seu mundo e em sua igreja, seu trabalho com os Smiths fez dela uma testemunha em primeira mão de conhecimentos secretos.

A vida de Jane ainda nos pressiona a romper os compartimentos entre o que consideramos história mórmon, história afro-americana, história das mulheres. Como a historiadora Quincy D. Newell escreve em sua biografia de Jane Manning,

“Embora o Oeste tenha sido um lugar de refúgio para inúmeros grupos religiosos ao longo da história americana, raramente incluímos afro-americanos entre aqueles que foram para o Oeste por motivos religiosos. Reconhecer as motivações religiosas de Jane ao se mudar para o Vale do Lago Salgado nos ajuda a começar a contar essa parte da história.” [1]

A foto abaixo de 2 3/16 por 3 3/8 polegadas foi tirada no estúdio de Edward Martin, um converso inglês, em Salt Lake City, nos anos 1860. Tradicionalmente, a fotografia tem sido identificada como um retrato de Jane Manning, mas a evidência é apenas circunstancial – aponta Quincy D. Newell, autora da primeira biografia acadêmica de Jane Manning, lançada em 2019. [2]

Retrato que se acredita ser de Jane Elizabeth Manning James. | Imagem: Cortesia da Biblioteca de História da Igreja, A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias

A autora ainda questiona qual haveria sido o popósito ou uso da fotografia. Continuar lendo

W. Paul Reeve: Redescobrindo os Primeiros Conversos Negros do Mormonismo

“É impossível policiar as fronteiras raciais”, afirma o historiador W. Paul Reeve. Professor da Universidade de Utah, Reeve coordena desde 2018 o projeto Century of Black Mormons (Século dos Mórmons Negros), uma base de dados digital que busca documentar a história de mórmons negros durante o primeiro século de existência do movimento religioso fundado por Joseph Smith.

W. Paul Reeve, professor da Universidade de Utah | Imagem: Cortesia de Daily Utah Chronicle.

Nesta entrevista exclusiva ao Vozes Mórmons, Reeve fala sobre sua jornada acadêmica para entender o passado racial dos santos dos últimos dias e os principais desenvolvimentos da historiografia sobre o passado racial mórmon nas últimas quatro décadas. Segundo ele, houve “três fases” de politicas raciais na Igreja SUD, fato que, observa, muitos de seus membros infelizmente desconhecem.

Reeve também pondera sobre a influência dos ensinamentos raciais passados sobre o mormonismo atual: “a Igreja”, ele afirma, “passou mais de 130 anos ensinando doutrinas e políticas raciais, mas não investiu a mesma energia para corrigir esses ensinamentos”. O historiador ainda lista as seis justificativas mais comuns entre membros SUD que reforçam a ideia de “inocência branca” durante o período da segregação racial mórmon, entre 1852 e 1978. Continuar lendo

Revelação a Newel K. Whitney Através de Joseph, o Vidente (1842)

Um ano antes de ditar a revelação sobre “pluralidade de esposas”, a qual viria a ser canonizada décadas após sua morte como a seção 132 de Doutrina & Convênios, Joseph Smith recebeu uma revelação em que o Senhor instruia seu futuro sogro sobre como realizar o casamento de sua filha ao Profeta.

Sarah Ann Whitney, em Utah. Em 1842, Sarah Ann Whitney foi selada a Joseph Smith em cerimônia oficiada por seu pai, e tendo sua mãe como testemunha. O ritual foi prescrito em uma revelação recebida por Joseph Smith | Imagem: Cortesia de Batsheba W. Bigler Smith Photograph Collection, circa 1865-1900, Biblioteca de Historia da Igreja, Salt Lake City.

Em 25 de julho de 1842, Joseph Smith Jr. ditou a Newel K. Whitney uma revelação sobre a cerimônia na qual Whitney lhe daria sua filha, Sarah Ann Whitney, em casamento.

A revelação foi publicada pela primeira vez este ano pelo Projeto Joseph Smith Papers, reconhecido projeto documental do Departamento Histórico d’A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, e faz parte do seu mais recente volume de documentos, cobrindo o tumultuado período entre maio e agosto de 1842.

De acordo com os editores, a revelação, antes inacessível ao público, traz “as únicas instruções existentes do período de vida de [Joseph Smith] para a realização de uma cerimônia de casamento plural”.

A cerimônia prescrita difere grandemente dos rituais de selamento documentados ou em uso n’A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias. 

Com então 17 anos, Sarah Ann era a filha mais velha dos comerciantes Newel Kimbal Whitney e Elizabeth Ann Smith Whitney. Tal como Sidney Rigdon, os Whitneys eram oriundos do movimento restauracionista campbellita.

A relação entre Joseph Smith e o casal era tão próxima que o Profeta Mórmon e sua esposa Emma viveram na “loja branca” dos Whitneys entre 1832 e 1836, mesmo prédio onde foi estabelecida a Escola dos Profetas em 1833. Os rituais iniciados naqueles anos em Kirtland seriam expandidos em Nauvoo, onde os Whitneys não seriam menos fieis a Smith.

Em 1831, após sua coversão ao mormonismo, Newel Whitney foi ordenado como bispo. No enclave mórmon de Illinois, Elizabeth Whitney tornar-se-ia a segunda conselheira de Emma Smith na Sociedade Feminina de Socorro, organizada em abril de 1842. No mês seguinte, Newel Whitney tomaria parte do pequeno grupo a receber a primeira administração dos rituais templários da investidura.

Com os mesmo rituais conferidos a mulheres, no ano seguinte, ambos os Whitneys passariam a fazer parte do Quórum dos Ungidos. Durante o último ano de vida de Joseph Smith, o bispo Whitney ainda faria parte do seu conselho teocrático, o chamado Conselho dos Cinquenta.

Autoridade patriarcal e laços dinásticos

Nesta revelação de julho de 1842, Newel K. Whitney é ordenado a afetuar a cerimônia não apenas “em nome de Jesus Cristo”, prática costumeira nos rituais mórmons, mas também em seu próprio nome, em nome de sua esposa, Elizabeth, e em nome dos seus “Progenitores”.

A autoridade sacerdotal de Newel Whitney, no texto ditado por Smith, é um “direito de nascença” e remete àquela dos antigos patriarcas bíblicos. O texto menciona o “Santo Melquisedeque Jetro”. Há tambem a menção a um futuro rei Davi.

As instruções ditadas por Smith prometem a Whitney “honra e imortalidade e vida eterna a toda tua casa”, revelando um aspecto dinástico do casamento entre Sarah e Joseph: sua união seria a união das duas familias, com os Whitneys ligados ao Profeta da sétima dispensação do evangelho “de geração a geração”.

Vendo a si como um elo entre deuses e mortais, Joseph Smith encabeçava em Nauvoo um reino familiar, do qual deveria fazer parte todo homem ou mulher que desejasse a glória celestial. Acima da Igreja pública, Smith iniciara o estabelecimento de uma Igreja secreta, construída a partir de uma teologia revolucionária, que ainda lhe custaria a aprovação de grande parte dos santos dos últimos dias.

Original perdido

O manuscrito original da revelação aparentemente não pode ser encontrado. Sobrevivem no acervo da Igreja dois manuscritos, em caligrafia não identificada.

Em 1912, o membro do Quórum dos Doze, e sobrinho de Sarah Ann, Orson F. Whitney transcreveu uma cópia manuscrita da revelação, de posse de seu pai, Horace Whitney. O apóstolo datilografou o texto e enviou sua nova cópia ao Presidente da Igreja, Joseph F. Smith. Orson F. Whitney acreditava que Horace havia recebido o texto diretamente de seu pai, Newel K. Whitney.

A revelação

Quarta-feira, 27 de julho de 1842

Em verdade assim diz o Senhor ao meu servo N[ewel] K. Whitney[:] aquilo que meu servo Joseph Smith fez conhecer a ti e à tua família e a respeito do qual concordaste é correto aos meus olhos e será coroado sobre suas cabeças com honra e imortalidade e vida eterna a toda tua casa, tanto jovem como velho, por causa da linhagem do meu Sacerdócio, diz o Senhor. [E]stará sobre ti e sobre teus Filhos depois de ti, de geração a geração em virtude da promessa Sagrada que agora faço a ti, diz o Senhor. Estas são as palavras que deves pronunciar ao meu servo Joseph e à tua Filha S[arah] A[nn] Whitney: eles devem tomar um ao outro pela mão e tu dirás [“]ambos concordam mutuamente – chamando-os pelo nome – em ser companheiros um do outro, por quanto vivam, preservando-se um para o outro, e de todos os outros e também ao longo da eternidade, reservando apenas aqueles direitos que foram dados ao meu Servo Joseph por revelação e mandamento e por Autoridade legal em tempos passados. Se ambos concordam em fazer o convênio e fazer isto, então dou S. A. Whitney, minha Filha, a Joseph Smith para ser sua esposa, para observar todos os direitos entre ambos que pertencem a essa condição. Eu faço isso em meu próprio nome e em nome da minha esposa, tua mãe, e <em> nome de meus sagrados Progenitores, pelo direito de nascença que é do Sacerdócio, revestido em mim por revelação e mandamento e promessa do Deus vivo obtida pelo Santo Melquisedeque Jetro e outros Santos Pais, comandando todos esses poderes para se concentrarem em ti e, por meio de ti, à tua posteridade para sempre. Estas coisas eu faço em nome do Senhor Jesus Cristo, que através desta ordem ele possa ser glorificado e que através do poder de unção Davi possa reinar como Rei sobre Israel, o qual será doravante revelado. Que imortalidade e vida eterna sejam a partir daqui seladas sobre suas cabeças para sempre e sempre[“]. 

Precauções

Três semanas após a cerimônia secreta, Joseph Smith escreveu uma carta ao casal Whitney, sem nomear Sarah Ann explicitamente. A correspondência não apenas oferece uma perspectiva sobre os sentimentos de Smith, mas também sobre o receio por sua vida e harmonia familiar com sua primeira esposa.

“[M]eus sentimentos são tão fortes por você[s] desde o que transcorreu entre nós, que o tempo da minha ausência [longe] de você[s] parece tão longo e sombrio”, escreveu o Profeta. Escondendo-se das autoridades policiais na casa de Carlos Granger, um não mórmon, Smith suplicava: “se vocês três viessem para me ver (…) isso me daria grande alívio”, afirmando necessitar do socorro “daqueles que me amam” no momento de solidão. Ele reiterava na carta a promessa de dar aos três “a plenitude de minhas bençãos seladas sobre suas cabeças”.

Duas precauções, no entanto, eram requisitadas por Smith: eles não deveriam visitá-lo quando Emma Smith estivesse presente, e a carta deveria ser queimada – instrução que os Whitneys evidentemente não seguiram.

Bênçãos

A união eterna almejada por Smith não considerava muitas diferenças entre o material e o divino. No dia 06 de setembro seguinte ao casamento, Smith deu a Sarah Ann Whitney a escritura de uma propriedade no Condado de Hancock, em documento autenticado pelo pai da jovem esposa plural.

Em 1843, no dia seguinte ao seu décimo-oitavo aniversário, Sarah Ann recebeu de Joseph Smith uma bênção por imposição de mãos, na qual suplicava a Deus para “coroá-la com um diadema de glória nos mundos Eternos”. A Sarah cabia permanecer no “convênio eterno” solenizado entre o casal. O vínculo eterno com a família Whitney é referido uma vez mais: Smith assegurava que “a casa de seu Pai será salva na mesma glória Eterna”. 

Um década de casamentos plurais

Sarah Ann foi descrita como uma das “estrelas guias” das jovens de Nauvoo, segundo sua amiga, Helen Mar Kimball. Ainda que alguns a considerassem “orgulhosa e um tanto excêntrica”, Sarah Ann era, na opinião de Helen Mar, “uma menina com a mente mais pura (…) e temente a Deus”. Helen Mar Kimball foi também selada a Joseph Smith aos 14 anos, em 1843, mesmo ano em que descobriu sobre o matrimônio de Sarah Ann. [1]

No ano em que desposou Sarah Ann Whitney, Joseph Smith vinha praticando casamentos plurais há, no mínimo, uma década, ainda que não tivesse plenamente desenvolvido a ideia de um poder selador que tornasse relacionamentos familiares válidos após a ressurreição.

Introduzindo o princípio do casamento plural sempre de maneira individual e secreta a alguns de seus seguidores, Smith negava publicamente a prática.

Um casamento para encobrir o casamento

Um dos subterfúgios usados por Joseph Smith para ocultar seus matrimônios plurais, protegendo a si e algumas de suas esposas dos olhos “gentios” e do restante da Igreja, eram novos casamentos públicos. Nove meses após ser selada ao Profeta, Sarah Ann Whitney (Smith) casou-se com Joseph C. Kingsbury, em cerimônia civil conduzida pelo próprio Smith. [2] No mês anterior, Joseph Smith havia conferido a Kingsbury uma bênção patriarcal em que prometia que sua esposa Caroline Whitney Kingsbury, falecida, estaria novamente com ele na primeira ressurreição.

Posteridade eterna?

Na divisora revelação de julho de 1843, Deus afirmava, por intermédio de Joseph Smith, que esposas lhe eram “dadas para multiplicar e encher a Terra” e “gerar as almas dos homens” (Doutrina & Convênios 132:63). A furtividade e muito provável baixa frequência de encontros íntimos com suas esposas plurais parecem não ter ajudado Joseph Smith a cumprir em vida um dos propósitos designados para o casamento celestial. E certamente, ele não esperava, e muito menos desejava, encerrar sua carreira profética nas mãos de assassinos, aos 39 anos.

Sarah Ann Whitney não teve filhos com Joseph Kingsbury e seu casamento foi dissolvido após o martírio dos irmãos Smith. Em 17 de março de 1845, Sarah Ann foi selada “para o tempo” ao apóstolo Heber C. Kimball, com quem viria a conceber sete filhos. Na teologia ensinada por Joseph Smith aos seus seguidores mais próximos, essas sete crianças seriam parte da sua posteridade com Sarah Ann Whitney.


Notas

1. Helen Mar Kimball Whitney, “Scenes in Nauvoo after the Martyrdom,” Woman’s Exponent, 1 Mar. 1883, 11:146.  Trechos citados na introdução histórica à revelação, no Projeto Joseph Smith Papers. 

Helen Mar Kimball reconta sua experiência como a esposa plural mais jovem de Joseph Smith em seus diários. Whitney, Helen Mar Kimball (2003), Compton, Todd M.; Hatch, Charles (eds.), A Widow’s Tale: the 1884-1896 Diaries of Helen Mar Whitney, Logan, UT: Utah State University Press.

Depos do assassinato de Joseph Smith, em 1844, Helen Mar casou-se com o irmão mais velho de Sarah Ann, Horace Whitney.

2. Após a revelação sobre a “lei do sacerdócio” ou “pluralidade de esposas” ter sido ditada por Joseph Smith, a pedido de seu irmão, Hyrum Smith, em 12 de julho de 1843, o texto foi mostrado a Emma Smith e a diversas autoridades eclesiásticas em Nauvoo. De acordo com o secretário particular de Joseph Smith, William Clayton, Newel K. Whitney pediu a Joseph C. Kingsbury para copiar o manuscrito. A cópia feita por Kingsbury foi levada pelos santos em seu êxodo rumo ao oeste, e foi a fonte para a publicação da mesma revelação no jornal Deseret News em 14 de setembro de 1852.

Racismo na BYU

Meu professor de “Fundações da Restauração” justificou a proibição do sacerdócio aos negros, dizendo: “Não vamos fingir que Deus não havia feito restrições raciais para o sacerdócio e o evangelho antes. Ele não queria que o evangelho fosse ensinado aos gentios em um ponto. Não sei por que Deus faz essas restrições, mas Ele deixou as duas continuarem por um longo tempo.” Embora eu possa não conhecer bem o histórico dessas restrições, fiquei ofendida com a sua declaração e com a sua tentativa de ignorar as perguntas sobre o assunto. Eu era a única afro-americana nessa classe de 200 pessoas, mas todos os que fizeram alguma pergunta tinham problemas com a proibição, e o professor respondeu defensivamente a todos eles. Sua abordagem para encerrar as perguntas dos alunos e insistir que não criticassem os profetas do passado impediu nossa capacidade de fazer perguntas e não aceitar tudo com “fé cega”.

O atual Apóstolo e Profeta Dallin Oaks, então Presidente da BYU, vestido como o mascote da universidade mórmon ‘Cosmo, o Puma’, em 1979.

Um amigo meu da BYU¹ (que é branco) e eu estávamos conversando sobre a ressurreição e o que aconteceria fisicamente conosco. Ele me perguntou: “Você não acha que após a ressurreição você ficará branca como o Pai Celestial e Jesus Cristo?” Suas suposições incorretas eram que 1) para sermos perfeitos, todos nós Continuar lendo

Igreja Mórmon Cede, Muda Investidura

A Igreja SUD confirma, com relutância, rumores de mudanças a seus rituais templários mais sagrados de modo a torná-los menos machistas.

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Representação do futuro Templo do Rio de Janeiro © Intellectual Reserve, Inc. 2017

A mais importante ordenança religiosa no mormonismo, o ritual da investidura foi estabelecido pelo Profeta Joseph Smith em maio de 1842, aproveitando sinais, símbolos, expressões, palavras, juramentos, e temas dos rituais maçônicos aos quais fora iniciado 2 meses antes. Desde então, a ordenança recebeu algumas alterações pontuais para se acomodar melhor aos seus contextos sociais contemporâneos. As mudanças apresentadas estas semanas podem ser as mais profundas e impactantes dos últimos 177 anos.

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Líderes da Igreja Mórmon Cedem a Pressão, Alteram Regras de Entrevistas

Em meio à intensa pressão pública sobre entrevistas sexualmente explícitas com crianças e acusações de abuso sexual e estupro de jovens acobertado pela liderança da Igreja, a Primeira Presidência d’A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias anunciou uma mudança nas regras para entrevistas pessoais de crianças e adolescentes, entre outras medidas para coibir o acobertamento de abusos.

Templo de Lago Salgado

O anúncio das novas diretrizes anteontem chegou após uma intensa semana de revelações de denúncias contra um ex-Presidente do CTM de Provo, Utah, que teria estuprado uma missionária e abusado sexualmente de outras, inclusive quando serviu como Bispo, Presidente de Estaca, e Presidente de Missão. Ainda mais explosivamente, as denúncias foram seguidas de testemunhos de acusações feitas durante décadas a vários líderes eclesiásticos como Bispos e Presidentes de Estaca, incluindo até dois Setentas Autoridades Gerais, que nada fizeram. E para piorar a semana da Igreja, múltiplas fontes jornalísticas denunciaram a Igreja por tentar silenciar denunciantes através de lobby político por um projeto-de-lei forçado com urgência na legislatura estadual de Utah.

Doravante, de acordo com as novas diretrizes anunciadas pela Primeira Presidência, qualquer indivíduo sendo entrevistado por um líder eclesiástico da Continuar lendo

Ex-Missionária Mórmon Vítima de Abuso Quebra Silêncio

Em 1984 o Presidente do Centro de Treinamento de Missionários da Igreja SUD em Provo, Utah, levou uma jovem missionária até um quarto secreto no porão do CTM e tentou estupra-la. Por décadas, ela tentou convencer vários Bispos e Presidentes de Estaca, e uma Autoridade Geral, a tomar providências para disciplinar seu estuprador, tudo em vão.

Em novembro de 2017, posando como jornalista coletando relatos de líderes eclesiásticos da Igreja SUD menos conhecidos, a vítima conseguiu agendar uma entrevista em dezembro de 2017 com seu violentador, Joseph L Bishop, que serviu como Presidente do CTM entre 1983 e 1986.

Bishop, que antes desse chamado havia servido como Bispo, Presidente de Estaca, Presidente da Missão Argentina Buenos Aires Norte, e trabalhado para a Igreja como Agente de Bem Estar na América Central, saiu do CTM e foi novamente contratado pela Igreja, desta vez para lecionar na universidade SUD Brigham Young University também em Provo até sua aposentadoria por idade. Bishop ainda publicou 2 livros que, até a semana passada, eram vendidos no site oficial da editora da Igreja SUD.

Bishop foi secretamente gravado confessando ter abusado sexualmente de várias jovens e várias missionárias sob seu cuidado durante sua longa carreira eclesiástica. E ainda admite ter confessado a Autoridades Gerais da Igreja sem ter sofrido quaisquer consequências disciplinares ou legais.

Abertura da página MormonLeaks, site que vazou a gravação

Em janeiro de 2018, a vítima abordou a Igreja através de seu advogado, supostamente para processa-la por acobertar o crime por décadas. Há uma semana, contudo, uma cópia da gravação para o público através do site MormonLeaks sem seu consentimento. Agora, pela primeira vez depois de uma semana de tumultuada repercussão pública, ela quebra o silêncio e emite uma nota pública: Continuar lendo

Igreja Mórmon Protege Estuprador, Predador Sexual

O ex-Presidente do Centro de Treinamento de Missionários d’A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias em Provo, Utah, que também serviu como Presidente de Missão, Presidente de Estaca, Bispo, e mais recentemente como professor na Universidade de Brigham Young, Joseph L Bishop, foi acusado repetidas vezes por pelo menos duas jovens a múltiplos líderes da Igreja SUD durante décadas.

Em nenhuma instância, nenhum líder tomou qualquer atitude administrativa, eclesiástica, ou policial contra Bishop.

Presidente Dallin Harris Oaks, Primeiro Conselheiro da Primeira Presidência e Presidente do Quórum dos Doze Apóstolos da Igreja SUD sob a adminitração do Profeta Presidente Russell Nelson (à direita)

A primeira vítima a vir a público (doravante vítima #1) é a jovem missionária que secretamente gravou uma confissão de Bishop, cuja gravação vazou na internet há uma semana. A segunda vítima (doravante vítima #2) foi anunciada publicamente pela própria Igreja SUD, que admitiu ter recebido suas acusações Continuar lendo

Funcionário do CTM Corrobora Parte da Acusação de Abuso Sexual

Um ex-funcionário do Centro de Treinamento de Missionários d’A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias em Provo, Utah, confirmou publicamente um bizarro e singular detalhe da acusação de tentativa de estupro levantada por uma ex-missionária ao ex-presidente deste CTM.

Joseph L. Bishop em 1972 (Foto: Arquivo do The Salt Lake Tribune)

O funcionário, que pediu para manter sua identidade anônima, descreveu o Continuar lendo