Abraão Faz 45 Anos

HipocéfaloNesta semana (dia 27) comemoramos o aniversário de 45 anos de quando o Museu Metropolitano de Arte de Nova Iorque devolveu para A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias os papiros originais usados por Joseph Smith, jr., para produzir o Livro de Abraão.

Esse evento foi comemorado com grande antecipação e efusivos sentimentos de antecipação, esperança, e até uma sensação de validação. Por mais de um século, estes antigos documentos haviam sido dados como perdidos, e subitamente em 1967 não apenas haviam sido re-encontrados, mas haviam sido retornados à Igreja!

Contudo, tão logo passou a euforia e o regozijo inicial, recaiu sobre a Igreja o que apenas pode ser descrito como “desconforto” sobre o documento, levando a quase silêncio da instituição oficial, e a décadas de esforços intensos (e inúteis) de dúzias de apologistas.

Como houve bastante interesse em comentários passados, em outros posts, sobre discutir a importância desse achado arqueológico, eu acho que essa data importante é a perfeita oportunidade (desculpa) para abrirmos espaço para essa discussão. Segue abaixo apenas uma breve introdução ao tema.

Entre 1798 e 1801, o Primeiro Cônsul Francês Napoleão Bonaparte embarcou na Campanha do Mediterrâneo para estabelecer controle de interesses franceses em rotas de comércio. Durante essa campanha, as forças francesas invadiram (e destruíram) o império Mameluco que controlava o Egito, apenas para serem rechaçados subsequentemente pelos ingleses.

Apesar do enorme fracasso militar e comercial, a expedição teve a boa-aventura de um grande sucesso: Napoleão incluiu na campanha militar um gigantesco grupo de cientistas e acadêmicos (167 intelectuais) com o explícito mandato de espalhar princípios do Iluminismo (i.e., as sementes do que hoje chamamos de Ciência e Racionalismo) e para realizar investigações e experimentos.

O contato súbito e inicial com as ruínas do passado egípcio imediatamente fascinaram muitos destes intelectuais que, por sua vez, trouxeram esse fascínio para a Europa Continental (e, depois, para a Grã-Bretanha) e estudos, investigações, pilhagens, e comércio de relíquias floresceram durante quase todo o século XIX.

Esse fervor cultural alastrou-se para os Estados Unidos, e um período chamado de “Egitomania” espalhou-se como fogo por toda a cultura Norteamericana durante todo o século XIX, afetando todos os aspectos culturais: literatura, arquitetura, arte, e até a academia.

Entre 1818 e 1822, um dos centenas de escavadores e pilhadores no Egito chamado Antonio Lebolo encontrou várias múmias e papiros, entre outras relíquias, em Tebes, e consequentemente foram removidas para a Europa para comercialização. Onze destas múmias, com vários “livros” de papiro (em rolos), foram parar nas mãos de Michael Chandler na Cidade de Nova Iorque no começo dos anos 1830. Conhecedor do lucrativo mercado gerado pela “Egitomania” nos EUA, Chandler passou a viajar pelo país, expondo e vendendo as relíquias egípcias.

Durante o verão de 1835, Chandler transitou pelo estado de Ohio. Ouvindo rumores dos feitos de Joseph Smith, que teria aprendido a decifrar e traduzir os caracteres da escrita egípcia (até então, feito impossível fora de um restrito círculo de acadêmicos franceses, e largamente desconhecido pelo público em geral). Curioso para averiguar as habilidades de Smith, ou espertamente pronto para lucrar com a óbvia fascinação de Smith com o Egito Antigo, Chandler foi até Kirtland encontrar-se com o Profeta Mórmon.

O encontro foi frutífero para ambas partes. Smith imediatamente anunciou que os papiros eram documentos originalmente escritos, de próprio punho, por Abraão, além de José (bisneto de Abraão), e o terceiro era um conto sobre a Princesa Katumin. Considerando os achados arqueológicos como sagrados, Smith iniciou negociações com Chandler para compra-los deste, e angariando uma pequena fortuna entre amigos e membros (estimados entre 50 e 100 mil dólares atuais), a Igreja adquiriu 4 múmias e 4 papiros (3 rolos ou livros, e 1 hipocéfalo).

Joseph Smith passou a expor as múmias como fazia Chandler, cobrando modestos preços de admissão de curiosos e viajantes, porém mais importantemente, começou o processo de tradução pelo Livro de Abraão, usando Oliver Cowdery e William Phelps como escrivões. Smith montou um caderno de traduções, com decifração dos hieróglifos egípcios e anotações sobre as regras gramaticais e pronuncias, e durante vários meses, produziu o que hoje chamamos de Livro de Abraão. Nem o rolo de José, nem o rolo da Princesa Katumin, foram agraciados com tentativas ou esboços de tradução.

A Igreja publicou o Livro de Abraão em 1842, em forma seriada, no jornal oficial Times and Seasons, incluindo cópias das ilustrações (com explicações por Smith) e do Hipocéfalo (também com explicações de Smith), e subsequentemente no jornal oficial da Igreja na Europa Millennial Star 5 e 6 meses depois. Em 1878, a Igreja publicou o Livro de Abraão completo numa coletânea chamada ‘A Pérola de Grande Valor’, que dois anos depois foi canonizada como Escritura Sagrada no jubileu de 50 anos.

Enquanto isso, os papiros originais (junto com as múmias) haviam permanecido em posse da família Smith, que optou por permanecer em Nauvoo, Illinois, durante a migração para o Oeste. Em 1856, Emma Smith decidiu vender os artefatos egípcios para Abel Combs, que os vendeu para o Museu de Saint Louis. Este museu faliu, e vendeu o grosso de sua coleção para o Museu de Chicago, e este, havendo multiplicidade de peças egípcias, vendeu a coleção Smith para o Museu Wood, também localizado em Chicago.

Em Outubro de 1871, uma conflagração desconhecida iniciou um incêndio que destruiu uma enorme parte da cidade, matando 300 pessoas e deixando mais de 100 mil desabrigados (um terço da população total de Chicago). Entre os prédios afetados, o Museu Wood e, presumidamente com ele, a coleção Smith e os livros de Abraão e José.

Aparentemente, em 1878 Apóstolos Orson Pratt e Joseph F. Smith viajaram por Chicago na tentativa de averiguar a sobrevivência dos papiros após a destruição do Museu Wood, e caso positivo compra-los de volta, mas sem sucesso.

Papiros destruídos pelo fogo. Fim de história.

Fim?

Facsimile 1Em 1966, um professor da Universidade de Utah Aziz Atiya estava no Museu Metropolitano de Arte de Nova Iorque fazendo pesquisa para um livro quando, fortuitamente, bateu os olhos num papiro comum com uma ilustração comum. Porém, esta ilustração continha uma alteração nada comum: o papiro estava colado numa folha de papel moderna, e faltando-lhe alguns pedaços no papiro original com falhas na ilustração, desenhos haviam sido completados no papel moderno! Atiya, que não era Mórmon mas que havia morado em Utah por décadas, chocou-se com uma percepção súbita: este era o papiro que Joseph Smith havia usado (e desenhado) para o seu Livro de Abraão!

Angustiado e surpreso com sua descoberta, Atiya vasculhou a pilha de documentos onde este papiro havia sido arquivado e a sorte lhe continuou a sorrir: não só encontrou mais fragmentos de papiros que haviam sido posse de Smith (incluindo as demais ilustrações usadas no Livro de Abraão), Atiya encontrou a carta escrita e assinada por Emma Smith para certificar que estes seriam os papiros usados por Joseph Smith!

Como os papiros foram parar no Museu de Nova Iorque foi, tanto quanto o achado em si, uma história interessante a se destrinchar. Para encurtar uma longa estória, parece que Abel Combs não vendeu *esses* documentos e *estas* múmias para o Museu de Saint Louis (mas outros papiros e outras múmias), e reteve os papiros de Joseph Smith consigo, deixando-os para a enfermeira que cuidou dele em seus últimos meses de vida. A filha (e neto) desse enfermeira venderam os artefatos ao museu em Nova Iorque após anos (décadas) de negociações.

As negociações e comunicações entre Atiya, a Primeira Presidência da Igreja, e os curadores do Museu, também tardaram, mas não duraram pouco mais de um ano, até que no dia 27 de Novembro de 1967 os papiros foram devolvidos para a Igreja.

Durante um pouco mais de um ano de negociações e conversas secretas confidenciais, algumas das Autoridades Gerais expressaram sentimentos de esperança e antecipação. Por exemplo, durante as negociações, N. Eldon Tanner da Primeira Presidência afirmou que a Igreja tinha enorme interesse nos papiros e que pagaria “qualquer preço” por eles.

A própria Primeira Presidência (David McKay, Hugh Brown, Eldon Tanner) escreveu:

Essa coleção é muito significante porque ela cria um elo distinto com a história inicial da Igreja e apoia completamente a asserção feita pelo Profeta Joseph Smith. Esses documentos importantes… serão valorizados e bem cuidados e ajudarão em pesquisas futuras e adicionar evidências à autenticidade da Pérola de Grande Valor.

Milton Hunter cita, ainda, N. Eldon Tanner regozijando que:

…o fato importante é que agora temos parte do manuscrito original do Livro de Abraão e que certamente comprova o fato de que Joseph Smith escreveu o Livro de Abraão de manuscritos em papiros antigos…

Contudo, não foi isso que ocorreu. Tão logo a Igreja recebeu os papiros, convocou acadêmicos e estudiosos (principalmente da BYU) para analisa-los, e o que se percebeu imediatamente e inequivocadamente foi que os documentos de onde Smith “traduziu” o Livro de Abraão simplesmente não dizem nada sobre Abraão, mas sim são textos funerários comuns. Ademais, as ilustrações foram reconstruídas de maneira equivocadas, completamente sem sentido, e os textos das ilustrações não correspondem em nada às descrições oferecidas por Smith.

Junte-se a isso o fato de que por um século críticos haviam previsto as lacunas nas ilustrações (corretamente) e que o alfabeto e o dicionário de Smith não correspondiam ao que acadêmicos haviam aprendido sobre egípcio antigo desde então (corretamente), e a Igreja viu-se na posição desconfortável de um achado histórico que desconfirma, ao invés de confirmar, afirmações históricas sobre o passado fundacional da Igreja. Inclusive, é muito possível que, movidos ainda pelo desdobramento negativo desse evento, as Autoridades Gerais tenham se esforçado tanto para comprar e esconder documentos históricos sensíveis de modo a se exporem excessivamente ao engodo de Mark Hoffman 15 anos depois.

No frigir dos ovos, a recuperação dos papiros não é hoje celebrada oficialmente. Talvez porque os papiros não apoiam a asserção de que Joseph Smith tenha encontrado, fortuitamente, escritos do profeta Abraão e corretamente traduzido-os no livro que hoje se encontra no cânone SUD oficial. Pelo contrário, os papiros demonstram que Smith “traduziu” o Livro de Abraão de um texto funerário 3000 anos mais novo que Abraão, sem quaisquer conhecimentos da língua ou cultura egípcias antiga.

Como lidar com essa constatação segue sendo um desafio para Mórmons modernos, e claramente, para a Igreja SUD. De qualquer modo, 45 anos atrás esta semana foi um marco importante na história, e para o futuro, da Igreja Mórmon.

Bibliografia

Larson, Stan. Quest for the Gold Plates: Thomas Stuart Ferguson’s Archaeological Search for The Book of Mormon. Freethinker Press, 2004.

Peterson, Donl. The Story of the Book of Abraham. Mummies, Manuscripts, and Mormonism. Deseret Book, 1995.

Peterson, Donl.  Antonio Lebolo: Excavator of the Book of Abraham, em BYU Studies, 1991.

Rhodes, Michael. The Hor Book of Breathings: A Translation and Commentary, Studies in the Book of Abraham. FARMS, 2002.

Ritner, Robert. The Joseph Smith Egyptian Papyri: A Complete Edition. Signature Books, 2012.

90 comentários sobre “Abraão Faz 45 Anos

  1. Acho perfeitamente saudável, com devido respeito ao autor do artigo, que analisemos as questões sobre o Livro de Abraão e demais assuntos abordados no vozesmormons através de outros pontos de vista também e tirarmos nossas próprias conclusões. Porém, se ainda restar dúvidas, poderemos seguir o exemplo de Joseph Smith:

    “Quando chegou a Kirtland, no final de junho, os santos mostraram grande interesse pelas múmias e papiros. Chandler havia ouvido falar que Joseph Smith dizia poder traduzir registros antigos. Ele pediu a Joseph Smith se poderia traduzir os papiros. Orson Pratt relembra: “O Profeta examinou-os e recolheu-se a seu quarto, onde perguntou ao Senhor a respeito deles. O Senhor disse-lhe que eram registros sagrados” e revelou a tradução de alguns dos caracteres.” (História da Igreja na Plenitude dos Tempos; Capítulo 13 – Dias Gloriosos em Kirtland, 1834-1836; página 159)

    • Marcos, o que eu acho mais interessante é como dois manuais do Instituto da Igreja (este que você citou acima e o da Pérola de Grande Valor) tacitamente concordam com o meu artigo acima, de que os papiros não continham escritos de Abraão!

      Ambos admitem que os Papiros de Joseph Smith foram encontrados, que eles são textos funerários, que eles datam mais de 2.000 anos depois de Abraão e que eles nunca mencionam Abraão.

      Além disso, ambos manuais, publicados pela Igreja, admitem que Smith não traduziu o Livro de Abraão no sentido técnico do verbo, como quem usa o Tradutor da Google (ao escrever que o “Profeta Joseph Smith não explicou seu método de traduzir esses registros”) e que não há evidências que corroborem a historicidade do Livro de Abraão como encontrado nos papiros (ao escrever que “um testemunho da veracidade desses escritos é basicamente uma questão de fé…” e que “evidência da veracidade do livro de Abraão não se encontra em uma análise de suas evidências físicas nem de seu fundo histórico…”).

      • Sinceramente, você distorceu completamente o que dizem os manuais. Porque não falou das partes em que os manuais afirmam sobre o teor sagrado do Livro de Abraão?

        [Editado e moderado de acordo com a Política de Comentários]

      • Marcos, você levantou dois pontos importantes aqui:

        1) Eu não falei “das partes em que os manuais afirmam sobre o teor sagrado do Livro de Abraão” por dois motivos muito simples: a) Nada seria mais óbvio do que um manual oficial da Igreja tratasse um texto do cânone oficial de Escrituras Sagradas como “teor sagrado”. Quando alguém lhe diz que esta “fazendo sol”, você pergunta se o céu “é azul”? b) A questão se o Livro de Abraão tem “teor sagrado” nunca foi, em nenhum momento, o foco da discussão acima. Re-leia o artigo acima, e preste atenção se há especulações sobre o “teor sagrado” do texto do Livro de Abraão. Achou? Não. Pois é. Irrelevante para a presente discussão.

        2) Eu não “distorci” o que dizem os manuais. Eu apenas li o que dizem os manuais! Eu vou lhe sugerir que há, basicamente, dois modos de se ler um texto.

        A primeira é uma leitura mais infantil, mais simplística, mais linear: lê-se uma palavra atrás da outra, um frase atrás da outra, e aceita-se as conclusões e construções como lhes são entregue.

        A segunda é mais adulta, mais intelectual, mais exigente: lê-se o texto, considera-se o que foi dito, considera-se o que não foi dito, considera-se como o que foi dito foi construído e por quê, e raciocina-se para si as próprias conclusões e construções.

        Cada um deve escolher como irá abordar um texto, e isso é uma escolha muito pessoal. O que eu estou expondo aqui é simplesmente um guia para ajudar aqueles que não sabem (ou não estão acostumados) a ler textos como adultos.

        Por exemplo.

        Quando você lê: “O Profeta Joseph Smith não explicou seu método de traduzir esses registros…”

        Você deveria se perguntar: Por que escreveriam isso, se Smith traduziu os registros como supõe-se pelo têrmo “traduzir” ou como sugere-se quando Smith monta um guia de alfabeto e gramática egípcia?

        Quando você lê: “… um testemunho da veracidade desses escritos é basicamente uma questão de fé…”

        Você deveria se perguntar: Por que escreveriam isso imediatamente após um breve reconhecimento de que não se sabe “como” Smith “traduziu” os registros, e logo antes de uma admissão de que não há evidência histórica que apoie uma tradução literal?

        Quando você lê: “… evidência da veracidade do livro de Abraão não se encontra em uma análise de suas evidências físicas nem de seu fundo histórico…”

        Você deveria se perguntar: Por que escreveriam isso se houvesse quaisquer “evidências físicas” ou “fundo histórico” para a “veracidade do livro”?

      • No link são descritas duas hipóteses:

        “One explanation is that it may have been taken from a different portion of the papyrus rolls in Joseph Smith’s possession. In other words, we don’t have all the papyri Joseph Smith had—and what we do have is obviously not the text of the book of Abraham. The Prophet described the papyrus he used in translation in these words: “The record … found with the mummies, is beautifully written on papyrus, with black, and a small part red, ink or paint, in perfect preservation.” (History of the Church, 2:348.) The Book of Breathings papyrus has no writing in red ink and is in an extremely poor state of preservation. It must have been in much the same condition in Joseph Smith’s day when fragments of it were glued haphazardly to other totally unrelated papyri. In fact, part of the outer border of facsimile two [Facsimile 2] in the book of Abraham has some of these unrelated fragments inserted in it.”

        “A second explanation takes into consideration what Joseph Smith meant by the word translation. While translating the Book of Mormon, he used the Urim and Thummim rather than dictionaries and grammars of the language. Translating with the Urim and Thummim is evidently a much different process than using the tools of scholarly research.”

        È claro que na página da Igreja citada acima essas duas hipóteses são explicadas com maiores detalhes. Eu gostaria de saber do Marcello se ele já conhecia essas duas hipóteses e qual sua opinião a respeito.

      • Sim. Ambas são velhas e manjadas.

        1) O mito do papiro com tinta rubro-negra vem de um erro (intencional ou acidental) na leitura dos relatos originais. Oliver Cowdery copiou os anúncios de Michael Chandler ao publicar a notícia sobre os papiros sem se dar conta de que estava mencionando papiros que Chandler já havia vendido antes de chegar em Ohio — e nós sabemos disso pois Cowdery menciona um número maior de rolos e fragmentos (e múmias) que Smith nos conta em seus relatos. Quando B. H. Roberts compilou os relatos para o seu História da Igreja, usou o texto de Cowdery e o adaptou na “voz” de Smith (deixando isso claro no rodapé).

        Nós temos a maioria do rolo do Livro de Respirações (i.e., “Livro de Abraão”), com seu começo, seu meio, e seu fim. Nós temos pedaços claros do rolo do Livro dos Mortos (i.e., “Livro de José”), suficientes para estabelecer de que o rolo incluia texto de dois documentos originais, para dois mortos diferentes, em anos diferentes, e que fora amalgamado posteriormente.

        Que essas desculpas ridículas persistem como uma “hipótese” é uma vergonha para a integridade intelectual (sem falar na honestidade básica) destes apologistas que insistem nelas.

        2) Quanto ao argumento de que os papiros apenas serviram de inspiração para revelações recebidas, trata-se de uma proposição sobrenatural e, portanto, não cabe ao escrutínio racional ou histórico.

  2. Caro amigo Marcello…

    A despeito de algumas críticas sobre este rico debate, temos que admitir que sem dúvidas, o livro de Abraão trouxe a luz grandes informações que seriam totalmente desconhecidas somente pelo estudo da Bíblia.

    Verdades como: Os Pais de Abraão adoravam ídolos; Terah, pai de Abraão, adorava ídolos; Terah, após se arrepender, retornou aos seus ídolos; Ídolos adorados na Caldéia eram ídolos egípcios; Sacrifício de Abraão e outros; Crianças eram sacrificadas; Aqueles que não adoravam ídolos eram mortos; Abraão foi trazido para ser morto ou sacrificado porque ele não adoraria ídolos”, “Terah, seu pai, estava por trás da tentativa de matar Abraão”, “Abraão foi preso ou amarrado; Quando sua vida estava em perigo Abraão orou; Um anjo veio para resgatar Abraão; Deus resgatou Abraão da morte; O altar (fornalha) e os ídolos foram destruídos; O sacerdote (ou líder) foi ferido e morto; Abraão era herdeiro ao sacerdócio de seus pais; Abraão portava o sacerdócio; Abraão ligado por sua linhagem a Noé; Crentes são a semente de Abraão e abençoados através dele; Abraão busca a Deus ansiosamente; Abraão faz conversos em Haran; Abraão possuía registros de astronomia os quais aprendeu de antigos registros e de Deus; Abraão ensinou astronomia aos egípcios; Abraão conhecia sobre a criação; Plano anterior para a criação; Os elementos da Terra obedecem a Deus; Abraão viu os espíritos pré-mortais; O Senhor instrui a Abraão a dizer que Sarah era sua irmã; Abraão possuía registros de seus pais; Abraão deixou registros de seu próprio punho; Faraó e a Fundação do Egito; Faraó era um descendente de Ham e também de Canaã; O primeiro Faraó, um bom homem, foi abençoado por Noé; Foi permitido a Abraão sentar no trono do rei; Houve uma grande fome na terra de Abraão; Abraão orou a Deus para que findasse a fome na Caldeia; Haran, irmão de Abraão, morreu na grande fome; Abraão tinha 62 anos de idade quando deixou Padan-Haran, não 75 como diz o Gênesis; Abraão tornou-se como um Deus, etc….

    Outra coisa interessante: Quanto à questão sobre as traduções numeradas dos hieróglifos dos fac-símiles, um fato digno de nota é que em 1912, o bispo episcopal A. F. Spalding da região de Utah reuniu oito grandes egiptólogos da época e submeteu os fac-símiles do Livro de Abraão tal como se encontram hoje no Livro de Pérola de Grande Valor, junto com a tradução dos hieróglifos numerados feitas por Joseph Smith. A priori ele saiu satisfeito quando a tradução destes egiptólogos saía diferente daquela feita pelo profeta. O caso rendeu uma boa polêmica e como na época não havia ninguém na Igreja versado em egiptologia o suficiente para fazer a defesa, parecia que a balança da verdade estava pendendo para os adversários de Joseph, contudo, um não mórmon e não residente de Utah mas um profundo erudito em egiptologia levantou-se em favor do profeta. Ele soube da polêmica pelos jornais e resolveu de per si investigar o assunto mais a fundo, sem nunca ter recebido um convite da Igreja para o fazer. Tais diferenças e dificuldades devem-se ao fato do egípcio ser uma linguagem pictográfica, isto é, um mesmo símbolo pode ter vários significados, a figura de um sol pode significar “sol”, “dia”, “calor”, “glória”, etc. Por exemplo, no fac-símile III, alguns egiptólogos apontam a tradução do No. 2 como sendo o nome da Deusa Ísis, acontece que esta mesma deusa é usada para designar a Faraó em alguns outros pergaminhos, como o traduzido por Smith!

    No entanto, entre outras coisas citadas em trechos retirados do manual “História da Igreja na Plenitude dos Tempos”, páginas 159, 246, 258 e 488, ao citar uma crítica do supracitado reverendo F. S. Spalding (bispo da igreja episcopal de Utah), complementa-se que “a Igreja ainda assim reconheceu a necessidade de responder a essas críticas. De fevereiro a setembro de 1913 uma série de artigos foi publicada a quase todo mês na revista Improvement Era, fornecendo possíveis respostas”. Fiquei muito interessado nestes artigos de 1913 no Improvement Era… Se alguém encontrar e postar, seria uma ótima contribuição ao saudável debate que aqui realizamos.

    Também, penso eu que da mesma maneira que contra-argumentou tão bem com uma citação incrível de Pratt quanto a “[convencer-nos] de nossos erros de doutrina, se tivermos algum, através da razão, através de argumentos lógicos, ou através da Palavra de Deus, e seremos eternamente gratos pela informação, e vós tereis a gratificante satisfação que haverem sido instrumentos nas mãos de Deus ao redimir seus colegas da escuridão que envolviam [nossas] mentes.” (Pratt, Orson. O Vidente, Março 1854), também deveria ser um pouco respeitoso com o pronto-embasamento que o Adriano postou de um renomado estudioso: “Néfi menciona as profecias de José, registradas nas placas de Labão, e conclui que “E não há muitas profecias MAIORES do que as que ele escreveu.” (2 Néfi 4:2). Mas onde se encontram as profecias de José? Por que não se encontram no Antigo Testamento. O registro de Abraão, traduzido pelo Profeta, foi subsequente publicado, e agora é conhecido como o Livro de Abraão, na Perola de Grande Valor. A tradução do Livro de José, entretanto, AINDA não foi publicada. EVIDENTEMENTE O PROFETA TRADUZIU ESSE REGISTRO,mas talvez ainda não tenha sido publicado, porque as grandes profecias ali contidas eram ‘grandes demais’ para o povo desta época.” (Ludlow, A Companion to Your Study of Book of Mormon, pp.130-31.)

    Ademais, difícil crer no “desconforto” que você alegou ter a Igreja, quando os líderes da mesma ainda continuam a citar Abraão como fundamento em seus ensinamentos nas Conferências Gerais, mesmo neste ano do “aniversário” que mencionou: “Quando Eloim, o Deus Eterno e Pai de nosso espírito, apresentou Seu plano de salvação, houve um entre nós que disse: “Eis-me aqui, envia-me” (Abraão 3:27). Seu nome era Jeová.” Élder Donald L. Hallstrom (Conf. Geral ABR/2012)

    • David,

      Você levantou muitos pontos interessantes ao mesmo tempo, então perdoe-me por responder da maneira mais direta e menos florida possível, por questão de espaço e tempo:

      1) Nenhuma dessas “verdades desconhecidas pela Bíblia” que você cita acima tem qualquer tipo de verificação histórica ou arqueológica.

      2) Nenhuma das “traduções” de nenhum dos caracteres egípcios feitas por Joseph Smith é confirmada por acadêmicos especializados em egípcio antigo.

      3) Improvement Era, 1913 aqui.

      4) Nenhum historiador SUD, nenhuma Autoridade Geral SUD, nenhuma anotação feita por Joseph Smith ou qualquer escrivão ou secretário dele, nenhuma peça de evidência histórica, nenhuma menção em qualquer diário de qualquer membro da Igreja entre 1835 e 1844 sugere que Smith tenha traduzido o Livro de José. Não há nenhuma indicação, em nenhuma fonte, de que essa tradução tenha sido realizada, que dirá exista!

      “Evidentemente o Profeta traduziu esse registro”? Baseado em qual evidência? Ele menciona alguma evidência para essa afirmação? Não. Por que? Porque não existe. Se ele não tem nenhuma evidência, por que diz “evidentemente” e por que afirma que ele “traduziu esse registro”?

      Daniel Ludlow simplesmente inventou essa estória! E eu não tenho respeito por “renomados estudiosos” que inventam estórias.

      5) Interessante essa citação em Conferência Geral. Eu não a conhecia. Obrigado.

      Você deve ter notado que ela não vem de um dos Apóstolos ou um da Primeira Presidência, o que faz muita diferença.

      A impressão que eu tenho com relação ao desconforto vem precisamente do linguajar cuidadoso que os manuais oficiais usam ao falar sobre o Livro de Abraão (e.g., “O Profeta Joseph Smith não explicou seu método de traduzir esses registros”, “um testemunho da veracidade desses escritos é basicamente uma questão de fé…” e que “evidência da veracidade do livro de Abraão não se encontra em uma análise de suas evidências físicas nem de seu fundo histórico…”). Eu não vejo o mesmo tipo de equivocação quando se escreve, por exemplo, sobre o Livro de Mórmon!

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