O Profeta Joseph Smith escreveu carta delineando felicidade como o propósito final da existência humana e borrando as linhas entre os proverbiais certo e errado.

No dia 10 de abril de 1842, Joseph Smith convidou Nancy Rigdon, a filha de 19 anos do Primeiro Conselheiro na Primeira Presidência Sidney Rigdon, a se encontrar com ele em segredo na residência do Apóstolo Orson Hyde, que encontrava-se em missão para a Palestina. Smith a levou para um quarto separado, onde trancou-se com ela, jurando-a de segredo absoluto, e declarou-se para ela propondo casamento secreto.
Como a jovem Nancy o recusou veementemente, Smith abriu a porta do aposento e pediu para que a esposa do Apóstolo Hyde, também chamada Nancy, entrasse e convencesse a jovem Nancy Ridgon a aceitar o casamento secreto e plural. Apesar de não saber que Nancy Hyde já era então esposa plural e secreta de Joseph Smith (inclusive em segredo de seu outro marido), Nancy Rigdon continuou a recusar com inflexibilidade até mesmo considerar a proposta, chegando a ameaçá-los de escândalo e gritaria se ambos não destrancassem a porta da rua e a liberassem para ir pra casa.¹
Rechaçado pela jovem Nancy, Smith escreveu-lhe esta carta no dia seguinte, justificando os eventos do dia anterior, e convidando-a a reconsiderar sua posição:
A felicidade é o objeto e a meta final de nossa existência; E será a sua finalidade, se perseguimos o caminho que nos leva à ela; E este caminho é a virtude, a retidão, a fidelidade, a santidade, e o guardar todos os mandamentos de Deus. Mas nós não podemos guardar todos os mandamentos de Deus sem conhecê-los primeiro, e não podemos esperar conhecer todos, ou mais dos quais já conhecemos, a menos que nos subjuguemos a ou guardemos aqueles que já recebemos. Aquilo que é considerado errado sob uma circunstância pode ser, e frequentemente é, correto sob outra.
Deus disse ‘Não matarás’; Em outro tempo Ele disse ‘Destruirás completamente’. Este é o princípio sobre o qual o governo do céu é conduzido – por revelação adaptado às circunstâncias nas quais os filhos do reino se encontram. O que quer que Deus requira é o correto, não importa o que seja, mesmo que não vejamos a razão daquilo até muito tempo depois que os eventos ocorreram. Se buscarmos primeiro o reino de Deus, todas as coisas boas nos serão adicionadas. Tanto como com Salomão, primeiro ele pediu por sabedoria, e Deus assim o deu, e com isso todo o desejo de seu coração, assim como com coisas que podem ser consideradas abomináveis para todos os que compreendem a ordem do céu apenas em parte, mas que na realidade são corretas porque Deus as deu e as sancionou através de revelação especial.
Um pai pode açoitar uma criança, e bem justificado, por haver roubado uma maçã; Enquanto se a criança tivesse pedido pela maçã, e o pai lhe-a dado, a criança teria comido a maçã com um melhor apetite; Não haveria açoites; Toda o prazer da maçã teria sido assegurado, e toda miséria do furto desaparecido.
Esse princípio será justamente aplicado a todas as interações de Deus com Seus filhos. Tudo que Deus nos dá é legal e correto; E é justo que gozemos de Seus presentes e Suas bençãos quando e onde Ele se dispuser a nos presentear; Mas se nos apropriarmos destas mesmas bençãos e prazeres sem a lei, sem revelação, sem mandamento, estas bençãos e prazeres se tornarão em maldições e condenações no fim, e nos prostraremos em tristeza e lamúrias de arrependimento eterno. Mas na obediência há alegria e paz imaculada e imperturbada; E conquanto Deus nos designou nossa felicidade – e a felicidade de todas as Suas criaturas, Ele nunca instituiu – Ele nunca instituirá uma ordenança ou um mandamento a Seu povo que não seja calculado em sua natureza a promover a felicidade que Ele preparou, e que não terminará na maior quantia de bem e glória para todos que sejam os recepientes da Sua lei e ordenanças. Bençãos oferecidas, porém rejeitadas, não serão mais bençãos, mas se tornam como o talendo escondido na terra pelo servo iníquo e preguiçoso; O bem investido retorna a seu doador; A benção é distribuída para aqueles que a receberão e aproveitarão; Pois para aquele já tem que lhe é dado, e que tem em abundância, porém para aquele que não lhe é dado ou que não recebe, ser-lhe-á tirado o que tem, ou o que poderia ter tido.
Sê sábio hoje, é loucura postergar;
No dia seguinte o precedente fatal pode reclamar;
Assim com que na sabedoria se perde no tempo;
Por toda eternidade.Nosso Pai Celestial é mais liberal em Seus pontos de vista, e mais infinito em Suas misericórdias e bençãos, do que nós somos capazes de crer e receber; E, ao mesmo tempo, Ele é mais terrível nos obreiros de iniquidade, mais horrível nas execuções de Suas punições, e mais preparado para detectar toda falsidade, do que nós somos capazes de supor que seja. Ele se deixará ser questionado por Seus filhos. Ele diz: ‘Peça e ser-lhe-á dado, busque e encontrará.’ Mas se tomar para si aquilo que não lhe pertence, ou o que Eu não lhe dei, será recompensado de acordo com suas ações; Mas de nada de bom lhes privarei aqueles que caminham eretos diante de mim, e fazem Minha vontade em todas as coisas – que ouvirão Minha voz a voz do meu servo a quem enviei; Pois Eu me deleito naqueles que buscam diligentemente conhecer Meus preceitos, e viver a lei do Meu reino; Pois todas as coisas serão reveladas a eles no Meu próprio tempo, e no final terão alegria.”²
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NOTAS
[1] Van Wagoner, Richard, Sidney Rigdon: A Portrait of Religious Excess, p. 295
[2] Roberts, BH (ed.), History of the Church vol. 5, pp. 134-136, A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias (ênfases nossas)
No contexto atual percebo que tenho duas coisas diante de mim.
Uma delas refere-se justamente, mesmo que de modo secreto (que acabou vindo a público), que a igreja privar as crianças pelos “erros” de seus pais pode estar certo, mesmo parecendo errado. Isso se dermos crédito inegável à autoridade ou legalidade religiosa de Joseph Smith, que acredita ser transferida aos atuais líderes.
A outra é justamente isso, da dualidade de Deus. Ora, se professo que a Ele cabe saber todas as coisas, e não há erros em Sua decisão, desobedecer seria falta de sabedoria, mesmo me sendo permitido.
Mas a questão é, como confiar que um homem qualquer, só por tê-lo dito, representa a vontade e verdade de Deus?
Ainda mais quando este ou estes insistem que não devem ser questionados, sob pena de aparente apostasia?
O que sutilmente leva muitas pessoas a sequer cogitar em orar a Deus após determinado “mandamento”, mesmo que este lhe pareça desconfortável.
Como garantir que os homens não subjuguem os demais encaixo de sua ignorância e preconceitos sem buscar na fonte Daquele que tudo sabe?
E como não parecer louco ao descrente?
Aparente apostasia foi singelo de tua parte, Gerson. Evidente que todo aquele que discordar, questionar, refletir, analisar, criticar é considerado “apóstata”, pois de acordo com os ensinamentos manipuladores “ a verdade está com aquele que é chamado por Deus para pregar o evangelho e administrar suas ordenanças”, logo o resultado é o endeusamento desses homens.
Com todo respeito àqueles que depositam fé e o “testemunho” em seu profeta, criador da religião mórmon, ele usou de muita tenacidade e imaginação para conseguir manter relações sexuais com várias mulheres sob a alegação de “casamento” secreto, “vontade de Deus”, “bênçãos”, “maldições, lamurias eternas”, “condenações”. Nota-se que ele utilizou em seus argumentos a doutrinação do medo com promessas de “ bênçãos eternas” pela via da obediência, talvez seu público fosse composto por pessoas humildes, com pouco repertório cultural ou mesmo inábeis na interpretação de seus discursos.
Com o pretexto da felicidade como objeto persecutório e meta final de todos os crentes daquela época, J. Smith revelou-se um sacerdote que praticou o autoritarismo como religião e na sua religião, ao ponto de tentar “desqualificar” e “violentar” a consciência de Nancy quando a mesma recusou-se a ceder aos apelos, usando todos os argumentos citados no texto.
Lamentável que o escritor do artigo não tenha contemplado o final deste jogo amoroso. Se Nancy rendeu-se aos apelos ou se foi resistente, atentando para sua consciência. Com certeza o protagonismo de Nancy renderia uma ótima roda de conversa
Não, a novela não terminou aí, Lisiane. Pelo que lembro, Nancy nunca aceitou isso, e pior, o denunciou a outros irmãos. Após isso foi execrada publicamente e, ainda nos meus resquícios de memória, parece que deu razão para uma extensa briga com outro apóstolo ou algo similar na época.